Setembro Amarelo é o mês de conscientização e prevenção do suicídio/Marina Bendhack com entrevista de Rodrigo Zub e Juarez Oliveira

Resumo
- A campanha Setembro Amarelo é realizada neste mês para conscientizar a população sobre as formas de evitar o suicídio e ajudar pessoas com problemas de saúde mental.
- A escuta, o acolhimento e o diálogo são fatores fundamentais na prevenção e conscientização. A ajuda da família e dos amigos também é um fator importante na prevenção.
- A conduta a ser feita diante de uma situação de ideação suicida é escutar, acolher e procurar ajuda profissional.
A campanha “Setembro Amarelo” tem o objetivo de conscientizar e prevenir situações de suicídio. Em entrevista, a enfermeira e coordenadora do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) II do Consórcio Intermunicipal de Saúde (CIS/Amcespar), a enfermeira Suellen Guimarães disse que a sociedade precisa ficar atenta aos sinais e sintomas que uma pessoa pode apresentar e levar ao suicídio. “Precisamos quebrar alguns tabus e efetivamente falar sobre essas situações. Mas não só sobre isso, a gente precisa também pensar nos fatores de risco, de sinais e sintomas que essas pessoas que estão em sofrimento vêm dando. Porque essas pessoas sempre vêm, tendo mudanças de comportamento, se isolando, elas vêm, no percurso, no caminho, dando sinais. E apresentando esses sinais, o que que eu, como família, como amigo, como colega de trabalho, posso fazer para ajudar essa pessoa?”, reflete a enfermeira.
Suellen diz que muitas vezes a própria pessoa não percebe que está sofrendo e não procura ajuda.Nesta sexta-feira foi realizada uma ação na rua Munhoz da Rocha, para incentivar o diálogo acerca do suicídio. Suellen relembra o tema da campanha do Setembro Amarelo de 2025 do Centro de Valorização da Vida (CVV): “Conversar pode mudar vidas”. “Qualquer outra doença é mensurável, a saúde mental não é mensurável, você não consegue mensurar o que está passando na cabeça daquela pessoa, então é um pouco mais difícil para a gente conseguir mensurar. […] Nós vemos muito do relato dos pacientes. Mas esse estigma existe e é muito grande”, diz Suellen.
O estigma sobre a saúde mental e o sofrimento humano é um dos fatores que prejudicam a informação e a prevenção do suicídio. Segundo Suellen, a maior parte dos usuários que procuram ajuda em saúde mental são mulheres. Já entre os homens há um preconceito mais forte quanto a isso.
A psicóloga do CAPS II, Esther Horn, afirma que a maior parte dos suicídios são cometidos por homens. Segundo dados da Secretaria de Vigilância em Saúde divulgado pelo Ministério da Saúde em setembro de 2022, no Brasil, a quantidade de mortes por suicídio alcança uma taxa de 12,6% para cada 100 mil homens. Já entre as mulheres, o índice é de 5,4% para cada 100 mil. A psicóloga afirma que as pessoas não aprendem a demonstrar sofrimento. “A gente socialmente não é ensinado a sofrer, demonstrar sofrimento. Crescemos nas famílias em que as pessoas fingem que não estão sofrendo, aí alguém falece, todo mundo vai sofrer quieto, ninguém vive esse momento junto. Então, isso é realmente difícil, dependendo do que acontecer, as pessoas poderem demonstrar que [sofrem]. Por exemplo, faleceu alguém da família? Conversem sobre, falem sobre. Claro que não é fácil, porque às vezes a pessoa viveu a vida inteira dessa forma, mas a dificuldade que a gente tem de lidar com o sofrimento do outro diz muito sobre a nossa dificuldade de lidar com o nosso próprio sofrimento”, reflete Esther.
Ela salienta que o sofrimento não é exposto na sociedade atual, causando sérios prejuízos para a saúde mental coletiva. “A criança não pode chorar, o menino principalmente. O menino não chora. O pai não chora na frente da criança ‘Ah, engole esse choro.’ Não consegue falar sobre o que está acontecendo. Nas oficinas, no CAPS, muitas vezes a gente tem que falar sobre sentimento, ensinar a reagir a sentimentos. Ensinar a nomear sentimentos. Não porque eles estão ali, porque na verdade poderia fazer uma oficina com um monte de adulto que está trabalhando, que está isso, que está aquilo, e também não ia conseguir nomear. Então, isso é muito difícil”, relata a psicóloga.
Esther enaltece que é importante dialogar e escutar as pessoas, independente do gênero, classe social ou raça. “Mas essas [classes média/alta] são a maioria das pessoas que não procuram ajuda de jeito nenhum, porque não é validado o sofrimento. E muitas vezes a tristeza vem desse lugar do… ‘Eu não sei por que eu sinto um vazio enorme. Eu sinto uma tristeza enorme. Eu tenho tudo e ainda assim eu estou muito triste. Ainda assim eu não vejo nenhuma solução.’ Essas pessoas precisam ser respeitadas, porque senão elas vão realmente se envergonhar e a gente pode acabar perdendo”, explica.

A psicóloga diz que é importante ficar atento aos fatores de risco, o que engloba não somente o que a pessoa expressa, mas também o que ela está passando em relação a parte financeira, perdas ou situações difíceis no geral. Esther relata que o suicídio nem sempre está associado à tristeza e ao isolamento. “Às vezes está tentando estar nesse lugar de dar conta de tudo, tem um trabalho que demanda, um trabalho com bastante situação traumática, muitas vezes a pessoa está acostumada, policial militar ou bombeiro, alguma pessoa que trabalha muito com sofrimento, ela tende já não demonstrar muito e ela vai colocando isso pra dentro. Às vezes, ela espera alguma coisa dela, por exemplo, erra num momento e naquele lugar que ela não conseguiu, não deu pra lidar, estourou naquela hora. Então, às vezes, não dá tempo nem da pessoa pensar, dela entender o que está acontecendo”, diz.
Uma das recomendações da psicóloga para agir diante de uma pessoa com pensamento suicida é se colocar à disposição para escutá-la e principalmente saber para onde direcioná-la para que possa buscar ajuda especializada. Em Irati, os locais que devem ser procurados são a unidade de saúde mais próxima da casa ou o próprio CAPS II. Além disso, há o número 188 do CVV, para situações emergenciais.
Esther reitera que a escuta sem julgamento é crucial para o acolhimento de alguém em sofrimento. “As pessoas tomam as próprias decisões, elas precisam tomar as próprias decisões e, às vezes, elas precisam falar em voz alta. Às vezes, a gente não fala sobre o que estamos sentindo e, dentro da nossa cabeça, aquilo é muito pior. Então, a pessoa realmente precisa falar e a gente tem que trabalhar com a nossa angústia, a angústia de querer fazer alguma coisa e não poder. Mas, muitas vezes, é esse lugar de poder ouvir, poder dizer que está lá, poder dizer que vai ouvir quantas vezes a pessoa precisa falar sobre aquilo, porque, às vezes, a pessoa precisa repetir. O próprio processo de luto, que pode causar uma ideação suicida, a gente fala na psicologia que o luto precisa ser gasto, a pessoa precisa gastar esse luto. Então, ela precisa falar que ela está sofrendo, falar que está com saudade, repetir aquela situação”, declara.
O termo Setembro Amarelo é oriundo de um caso de suicídio de um jovem de 17 anos. “Foi lá em 1994, nos Estados Unidos, que um jovem de 17 anos, o Mike M, ele era muito habilidoso, gostava de pintar carros, e ele restaurou um Mustang de 68 e pintou de amarelo. Por isso que ficou o setembro amarelo, e uma coisa que me chama muita atenção é que ninguém percebeu”, diz Suellen, que aponta para a importância do diálogo, pois nem sempre os sinais de sofrimento são visíveis.
O CAPS II de Irati atende atualmente cerca de 130 pacientes dos municípios de Irati, Guamiranga, Inácio Martins, Rebouças, Teixeira Soares e Fernandes Pinheiro. Suellen contou quais atividades são realizadas. “A gente faz atendimentos, algumas situações específicas, individuais, atendimento médico, as oficinas terapêuticas e as oficinas temáticas. Hoje a gente tá trabalhando com temática pra gente tentar descobrir e conversar com eles sobre esses fatores. A gente realiza passeios com eles também para inserir eles, mostrar as possibilidades de inserção nessa sociedade”, relata Suellen.
Os casos que chegam ao CAPS geralmente são encaminhados pelas unidades básicas de saúde dos municípios, mas o serviço também oferece atendimento porta aberta para alguns casos, explica a enfermeira. “A gente fala que a gente compartilha o cuidado. O paciente é lá da unidade básica de saúde, porque é o território dele, a unidade precisa conhecer, conhece a família, e nós eles vão uma vez por semana”, salienta a enfermeira do CAPS II.