Fumicultores e fumageiras não entram em acordo sobre preço do tabaco

Negociações sobre o preço do tabaco para a safra de 2021/2022 tiveram divergências em relação…

24 de dezembro de 2021 às 13h11m

Negociações sobre o preço do tabaco para a safra de 2021/2022 tiveram divergências em relação ao custo de produção. Negociações devem continuar no próximo ano/Karin Franco, com reportagem de Paulo Sava e Rose Harmuch

Presidente do Sindicato Rural de Irati, Mezaque Kecot Veres. Foto: Reprodução Facebook

Fumicultores e representantes não conseguiram entrar em acordo com as empresas fumageiras sobre o preço do tabaco para a safra de 2021/2022. A negociação ocorreu nesta semana, em Santa Cruz do Sul (RS), na sede da Afubra.

Um dos entraves foi o custo de produção que causou divergência entre os negociadores. O acordo entre as partes estabelecia que fumicultores e empresas fumageiras estabelecessem o custo de produção em conjunto, seguindo uma metodologia feita Fumiagro.

Contudo, representantes dos fumicultores apontam que as empresas fumageiras não respeitaram o acordo feito no ano passado. “Eu já de olho nisso e vendo os resultados passados, por ter algumas divergências na elaboração do custo de produção, não participamos. Foi feito o custo em conjunto que seria para chegar nessa hora e ter o custo estabelecido, a porcentagem, a defasagem e já somente entrar na negociação para ver somente a questão do reajuste. Mas infelizmente não foi assim”, conta o presidente do Sindicato Rural de Irati, Mezaque Kecot Veres, que acompanhou as negociações.

Segundo o presidente, as divergências iniciaram já na elaboração dos custos de produção. O acordo era que a variação fosse calculada em conjunto, mas o presidente explica que houve empresas que desrespeitaram. Uma delas contratou outra empresa para fazer o custo, deixando de fora os fumicultores. “Tiveram duas que já não cumpriram todo o processo de produção junto, não puderam participar dessas reuniões, então ficará talvez para janeiro e fevereiro, que é a Universal e a Philip Morris”, disse.

A proposta dos produtores foi um reajuste que levava em consideração a variação do custo de produção, acrescido de 10%. Esse percentual acrescido representa a perda que o produtor teve nas últimas safras. “Você tem uma defasagem, você solicita na negociação, você solicita um ganho para sustentabilidade, para a rentabilidade”, explica. O preço não foi acordado entre as partes.

Das sete empresas que participaram das negociações em Santa Cruz do Sul, apenas a JTI ofereceu uma proposta acima do custo de produção feita pelos representantes. “Foi a única que fez uma proposta acima do custo, da variação do custo e do aumento real. Olha, em todos esses anos que estou participando das reuniões, nunca houve isso. Nesse caso, temos que reconhecer que houve um avanço”, conta.

A proposta feita pelos representantes dos produtores era de 24,23% de reajuste. O percentual leva em consideração os 14,23% de custo de produção calculado em conjunto e os 10% de sustentabilidade da atividade.

A contraproposta da JTI foi de 16%. “Esse aqui nós vamos voltar a conversar com eles, mas também o nosso reconhecimento que já ofereceram acima do custo”, explica.

Já na proposta da BAT, que substitui a Souza Cruz, os produtores consideraram que o reajuste ficaria abaixo do custo de produção. A proposta feita pelos produtores foi de 26,51% de reajuste, sendo 16,51% de custo de produção e 10% de sustentabilidade da atividade.

Mas a proposta da BAT foi de apenas 13,8% de reajuste. O percentual de reajuste é abaixo, inclusive, do percentual de custo de produção estabelecido pela própria empresa que foi de 15,28%, o que significa 1,23% a menos que o percentual calculado em conjunto com os produtores.

Mezaque destacou que há outro problema com a empresa que desestimula o aumento da produtividade do produtor. “A BAT tem uma metodologia que também não foi aprovada no nosso entendimento pela representação dos produtores, eles fazem tipo uma cobrança de royalty. Um desconto do aumento da produtividade. Vamos dizer assim: aumentou 30 quilos a média de produção de tabaco, esses 30 quilos ou uma parte disso, a empresa fica. Nós já discutimos que não procede”, disse.

Outra proposta abaixo do custo de produção foi da China Brasil. A proposta feita pelos produtores foi de 28,83% de reajuste, sendo 18,83% de custo de produção calculado em conjunto e 10% de sustentabilidade da atividade. A proposta da empresa China Brasil foi de apenas 15%. “Uma diferença grande também”, explica.

As demais propostas seguiram a mesma tendência. Para a Premium Tabacos, os produtores propuseram um reajuste de 28,56%, sendo que 18,56% referentes a custo de produção e os 10% de sustentabilidade da atividade. A proposta apresentada pela Premium Tabacos foi de 13,28%.

Com a empresa CTA, a proposta de reajuste dos produtores foi de 32,67%, com 22,67% de custo de produção e 10% de sustentabilidade da atividade. Já a proposta da CTA foi 15,3%.

Já para a empresa UTC, a proposta que os produtores fizeram foi de um reajuste de 29,24%, com 19,24% relacionado a custo de produção e 10% para sustentabilidade da atividade. A empresa não apresentou proposta formalmente. “Eles não ofereceram nada e acenaram que poderiam estar na faixa de 13% o reajuste”, detalhou.

O maior reajuste proposto pelos produtores foi com a empresa Alliance One. A proposta dos produtores foi de 38,43%, sendo 28,43% de custo de produção e 10% para sustentabilidade da atividade. A Alliance One propôs um reajuste de 15%.

Para o presidente, as propostas forçam um achatamento nos preços, que já são influenciados por descontos nos produtos que são produzidos pelos agricultores. Um exemplo são os descontos de umidade para quem não usa máquinas, mas as próprias mãos na seleção. “Desconto dessa produtividade que você tira ali 30, 40 quilos por ano. Em dez anos, são 400 quilos. É mais ou menos igual àquela questão de juro sobre juro. É um juro sobre juro negativo”, disse.

O presidente ainda elenca outros fatores que aumentam no custo de produção e que são desconsiderados pelas empresas fumigeras. Um deles é que, em algumas situações, os agricultores tem que adquirir produtos fora do que fornecido pelas empresas. “Fornecem o insumo para o produtor, só que o produtor precisa comprar o produto fora. Esse produto fora não entra na conta da produção”, explica.

Mezaque ainda destaca os custos com trabalhadores rurais para a produção. Segundo ele, a proposta das empresas não inclui esses custos. “Chega nessa época da colheita e da secagem, os produtores estão lá cuidando durante a noite. Digamos assim, se ele levanta duas, três ou quatro vezes por noite, o custo de produção calcula assim: quantos minutos você gasta a cada operação? Vamos dizer 30 minutos. Ele levanta três vezes por noite, 1h30. E pagam o mesmo valor que fosse durante o dia”, conta.

No caso de empregados, o custo com adicional noturno fica para o produtor rural “Tem a diária do empregado, que chega na época da colheita, e o agricultor fornece muitas vezes a alimentação. Essa alimentação, quando é um almoço, tem um valor. Quando é merenda, tanto da parte da manhã, como da parte da tarde, não conta um valor. E a alimentação do agricultor também não conta”, disse.

O presidente contou que o Sindicato não participou ativamente da negociação porque já anteviam que as negociações não seriam frutíferas. “Se as empresas seguissem essa proposta, mais uma porcentagem de aumento real, claro que daí nós iríamos participar”, explica.

No próximo ano, as negociações deverão recomeçar. Em janeiro já haverá uma nova rodada. “Vamos tentar e caso, não tenha, claro que vamos buscar garantir esses direitos dos produtores, vamos buscar o Ministério Público Federal do Trabalho para ver o que pode ser feito”, conta.

Produção

No Paraná, há 29 mil famílias de fumicultores, totalizando um grupo de 117 mil pessoas que trabalham com a cultura do tabaco no estado.

Segundo o presidente, os agricultores precisam estar atentos já que a há previsão de quebra de safra neste ano. “Deve ter uma queda da produção. O produto deve ser valorizado. Importantíssimo o produtor estar atento à essa qualidade, à essa negociação. Acompanhar a negociação, principalmente na hora da venda. Não deixar essas empresas explorar porque aqui acontece uma negociação, nós vamos lá para melhorar o preço da tabela e na hora de vender, o produtor está sozinho naquela rampa de venda. E ali acontece a classificação. Luzes diferentes, o produtor sozinho, de repente 10 a 15 funcionários da empresa. É uma outra situação que precisamos estar atentos também”, relata.

Mezaque destaca que em algumas negociações, os produtores ainda conseguem ter uma lucratividade, mas em alguns contratos, o agricultor está perdendo. “De algumas empresas onde a produtividade está sendo um pouco maior, o produtor tem uma lucratividade. Mas pelos cálculos que foram feitos, muitas empresas o agricultor está tendo prejuízo”, disse.

O presidente destaca que os agricultores acabam tendo dificuldades de negociação. “Precisa ter equilíbrio entre oferta e demanda. Quando tem muita oferta, as empresas querem atuar no ramo do comércio, da compra e venda, aí facilita o jogo para eles. Quando falta o produto, é melhor para o produtor”, disse.

Além da dificuldade de negociação, o produtor também não calcula corretamente os custos de produção. Um dos exemplos é na mão de obra. “Muitas vezes o agricultor acaba não contando a mão de obra dele. Veja só, para você produzir um hectare de tabaco você precisa trabalhar 902 horas. Se a pessoa estivesse trabalhando em um outro ramo, ela estaria recebendo. Se ela fosse um empregado ela estaria recebendo, recendo 13º, hora-extra noturna, toda essa situação”, conta.

A depreciação do custo de produção tem feito com que o cenário atual seja bem diferente que o registrado no passado. De acordo com Mezaque, há mais de oito anos, o agricultor tinha vantagens com a cultura. “Nós fizemos um cálculo aqui de Irati. 3.300 hectares de tabaco, dava R$ 26 milhões de renda bruta. Essa era a margem de lucratividade. E 55 mil hectares de soja, milho e feijão dava um prejuízo naquela época de R$ 10 milhões”, disse.

Mas isso mudou nos últimos cinco ano com a defasagem da cultura. “Aqui no Paraná, os agricultores vendem, somando todos, R$ 1,6 bilhão. As empresas colocam mais R$ 1 bilhão, que agregam valor. Sete empresas agregam o valor no produto do produtor, mais o dobro. É bom resultado para as empresas, acionistas das empresas. Mas está sendo um péssimo resultado para o agricultor”, conta.

O presidente ainda destaca que a cultura está passando por uma modificação, com a diminuição do uso de cigarro de papel, com pessoas deixando de fumar e uma pressão regulatória grande em relação ao produto. “É um cenário que temos que ir com certa cautela, não pode se estimular um avanço de área plantada”, explica.

Por isso, ele acredita que é preciso diversificar a produção. “Nós precisamos nos preparar com outras atividades que tragam renda, que agreguem valor. O tabaco ocupa 16% da área da propriedade, então imagine o potencial que temos desses 84% restante da propriedade. Então precisa apoio do poder público para nós termos outras opções. Inclusive, isso faz melhorar a relação porque as empresas precisam correr atrás do produtor”, disse.

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