Em entrevista à Najuá, a vice-prefeita de Irati, Ieda Waydzik, e a enfermeira Luciane Batista relataram sobre suas experiências e sequelas deixadas pela doença/Karin Franco, com reportagem de Juarez Oliveira e Rodrigo Zub
Ieda Waydzik e Luciane Batista relataram suas experiências com a Covid-19. Foto: SECOM e Najuá/Arquivo |
A Covid-19 é uma doença que afeta as pessoas de forma diferente, fazendo com que muitos tenham que enfrentar um tempo de recuperação após a cura da doença. Entre as pessoas que tiveram a doença estão a vice-prefeita de Irati, Ieda Waydzik, e a enfermeira Luciane Batista que aceitaram contar como foi sua experiência com o Covid-19 e como tem sido o processo de recuperação durante entrevista no programa “Meio Dia em Notícias”.
A vice-prefeita de Irati conta que foi diagnosticada com o coronavírus há mais de um mês. “Eu estava sentindo uma sensação estranha no corpo. Não tinha febre, mas tinha um pouco de dor de garganta e uma sensação de frio. Eu fui até o Pronto Atendimento e lá eu fiz o teste do Covid. Então foi diagnosticado como positivo”, disse.
Com a confirmação, Ieda conta que recebeu a medicação e foi até a sua casa para o período de isolamento. “O que é a parte, talvez, mais terrível do Covid que é a pessoa doente ficar sozinha. Ficar enfrentando a doença num isolamento total, sem poder ter muito contato com as outras pessoas”, relata.
Após uma tomografia, Ieda descobriu que seu pulmão já estava 5% comprometido. Até o final da sua recuperação, 10% do pulmão ficou comprometido por causa da doença. “A partir daí eu continuei acompanhando, o meu pulmão chegou a quase 10%, fiz todo o acompanhamento, mudamos a medicação. Passei a tomar injeções de anti-inflamatório, aquela medicação mais pesada, mais difícil. E fomos acompanhando. Levei aproximadamente 20 dias para me sentir mais reestabelecida”, disse a vice-prefeita.
Quando foi diagnosticada com a Covid-19, Ieda já havia tomado a primeira dose da vacina Coronavac há cerca de aproximadamente dez a 15 dias. Para ela, a primeira dose foi fundamental para que o caso fosse mais leve. “Eu imagino que por isso a minha Covid não foi tão forte, não tive consequências tão mais graves como a gente tem visto o luto terrível que a nossa cidade está mergulhada com tantas perdas de pessoas”, explica.
Após a recuperação, a vice-prefeita conta que ainda tem sequelas da doença e que estão sendo tratadas. Uma delas é o uso de medicação para afinar o sangue, já que ela precisa recuperar o pulmão e não correr risco de ter trombose.
Ieda também relata situações de cansaço e fadiga que ainda restam e que acabam comprometendo o lado profissional, já que ela consegue ir para a prefeitura apenas na parte da tarde, enquanto se recupera dos sintomas pós-Covid. “Eu sinto canseira, eu sinto taquicardia, falta de ar. É bom ressaltar que eu não tive falta de ar durante o Covid. Não cheguei a ter aquele quadro pesado de se sentir sufocada, de precisar respirador, enfim. Mas o fato é que o corpo da gente sente, o pulmão sente e então até hoje eu tenho esses sintomas, principalmente, falta de ar quando falo muito. A gente se agita e aí para falar, você tem uma certa dificuldade”, conta.
Segundo a vice-prefeita, o trabalho dos médicos também foi fundamental na recuperação. Ieda destaca que as pessoas precisam estar atentas nos primeiros sintomas, para que os profissionais de saúde possam atuar logo no início. “Você tem que prestar muita atenção nos sintomas que você tem e não achar que aquilo é simplesmente uma dor de garganta, que aquilo é simplesmente um resfriado. É preciso que você verifique o teu pulmão porque o pulmão não dá sinal nenhum para a gente que ele está comprometido. E eu imagino que o que dificulta até para os médicos é a falta de verificação do pulmão de como ele está, que aí o quadro se agrava e quando a pessoa vai procurar o médico, o hospital, ela já está numa situação mais debilitada”, destaca.
O esposo de Ieda, o engenheiro Dagoberto Waydzik, também foi diagnosticado com Covid-19 durante o tempo que ela esteve doente. “Mas o Dagoberto também ficou doente, embora com um quadro mais leve. Ele tinha muita tosse, ele ficou sem voz, afônico, ficou um pouco mais debilitado na questão da área de garganta. Mas o pulmão dele não ficou tão comprometido. Agora ele já está voltando às atividades normais”, conta.
Já a enfermeira Luciane Batista, que é responsável pela unidade Sentinela, teve um caso mais grave de coronavírus, ainda em novembro do ano passado. Ela chegou a ser internada em Laranjeiras do Sul, se recuperou, mas acabou perdendo sua mãe, que se tornou mais uma vítima fatal da doença.
A enfermeira recebeu o diagnóstico positivo no dia 10 de novembro. Onze dias depois, ela foi transferida para Laranjeiras do Sul, onde ficou até se recuperar.
Mas assim como outras pessoas recuperadas pelo Covid, ela sentiu sequelas. “Uma parte do meu pulmão esquerdo não consegue expandir. Então, o atravessar a rua, simplesmente atravessar a rua eu já sinto esforço respiratório, um cansaço. Eu conseguir fazer uma academia, eu não consigo. Eu tentar queimar uma caloria a mais do que eu preciso para viver, eu não consigo fazer nenhum tipo de atividade física, por enquanto, porque eu canso muito. Eu sinto muito esforço respiratório, até taquicardia. A taquicardia é a elevação dos batimentos cardíacos”, disse.
Após a alta do hospital, a enfermeira voltou para casa onde continuou a receber os tratamentos médicos pós-Covid. “Eu tive atendimento de fisioterapeuta residencial, eu tive atendimento domiciliar, onde ela me ensinou como eu teria que voltar a respirar, quais seriam as atividades que eu teria que realizar porque nem lavar um copo, um prato, como fazia antigamente, eu tinha. Aquela normalidade. É um cansaço muito grande. Atividade física é mais domiciliar. Alguns exercícios que eu faço respiratório, alguma atividade um pouco mais domiciliar”, conta.
Luciane voltou ao trabalho apenas em janeiro e continuou no atendimento de casos de Covid-19. Segundo ela, entre as atividades, a principal está em dar atenção aos pacientes. “Além da medicação, do atendimento do médico, a população quer atenção. Às vezes, ela quer um sorriso, quer um carinho. A gente tem que ter calma para poder orientar porque, às vezes, você fala 20 vezes a mesma coisa, até a pessoa entender. A gente tentar colocar na população o importante que é cumprir o isolamento. Para mim, a pior dificuldade nossa do Covid é a pessoa não entender que o isolamento é para você e para sua família”, explica.
Contudo, com a morte da mãe alguns meses após a sua recuperação, Luciane precisou se afastar. Emocionada, ela comentou sobre sua perda. “O Covid não levou a minha vida, ele tentou. Ele tentou levar minha vida. Mas levou meu coração. O meu coração foi porque era a minha mãe. A pessoa que você chamava, que você ligava, que você esperava o telefone tocar e agora o telefone não toca mais. Você não vai ouvir mais a voz que chamava, ela me chamava de Princesa. Eu não tenho mais. Não tenho como”, disse.
Luciane também descobriu que ficou com sequelas psicológicas. “Desenvolvi uma síndrome de ansiedade, de pânico, acho que por todos os acontecimentos que passaram”, relata.
Segundo a enfermeira, esse não é um episódio isolado já que a saúde mental de profissionais de saúde tem se desgastado desde o início da pandemia. Ela conta que somente na vizinhança dela, houve vários casos de perdas: a morte de uma mãe no parto, crianças sendo cuidadas pela avó, pai e filho que foram internados e tiveram piora do quadro. “A gente vê isso. Pessoas que tinham tudo pela frente e foram”, conta.
Por meio de um exemplo, ela conta que é difícil para os profissionais de saúde acompanhar as perdas tão de perto. “Hoje, vamos supor uma segunda-feira, eu vou conversar com Seu Luis aqui dentro, eu explico o isolamento, medicação, tudo. E na quinta-feira eu fico sabendo que infelizmente o Covid tomou muito rápido o pulmão dele e foi ao óbito. É muito triste para nós. A gente está dando o nosso maior esforço, a gente está aqui. Hoje cedo estava horrível o frio. Mas a gente estava aqui”, afirma.
No entanto, a enfermeira conta que há casos de recuperação que ajudam a trazer esperança. Um dos exemplos contados é de um paciente em que ela ajudou no tratamento após ele sentir dificuldade de respiração. “Ele falou assim: ‘Eu não consigo respirar’. Eu falei: ‘Vamos para a cadeira’. Ele pegou na minha mão e falou assim: ‘Lu do céu! Eu tenho filho! Como vou fazer?’. ‘Eu sou prova viva! O Covid não me pegou 85%? Você está aqui na UPA, você está onde precisa estar para receber o atendimento. Você não consegue respirar. Você precisa respirar. Eu não tenho muito para te dar, mas pegue na minha mão’. Coisas que, às vezes, não pode fazer. ‘Pegue na minha mão que eu vou te passar a energia porque o poderoso Deus que me salvou vai salvar você também’. Eu conversei muito com o Rodrigo, muito. Eu fui para casa à tarde. Ele foi transferido para a Santa Casa. A esposa dele postava bastante no Facebook. A gente colocava em oração, pedia a Deus que abençoasse a família. E ver a vitória dele saindo da Santa Casa, com a família esperando. A gente vendo aquela alegria dos filhos, da esposa, da mãe, da irmã, para a gente é uma vitória”, disse.
Uma das formas que Luciane tem encontrado para enfrentar a pandemia é a religiosidade. Segundo ela, o processo de orar e de ter fé no tratamento tem ajudado não só ela, mas os pacientes que passam por esse período. “É o poder da oração, sim. De você orar. E não custa nada de você fazer um pensamento positivo pelo seu Luis, aquele senhorzinho que está lá. Você sabe que Deus escuta bastante”, relata.
A enfermeira alerta que as pessoas precisam se cuidar, principalmente porque a contaminação está ocorrendo dentro de casa. Ela conta que apesar de trabalhar no atendimento da Covid-19, sua contaminação ocorreu em casa, assim como da sua mãe. Por isso, todo cuidado é pouco. “O meio de contaminação está sendo dentro da casa mesmo porque a pessoa acha que é só gripal. ‘Ah, não posso parar porque sou autônomo, eu tenho que trabalhar’. Mas ele tem que ver quanto eles estão colocando em risco no local de trabalho e dentro da casa. Vou te dar um exemplo: um senhor lá do interior de Gonçalves Junior, acho que 78 anos, ele não saiu para fora do murinho da casa dele. Ele teve Covid e foi à óbito. Mas como ele foi à óbito? A família foi quem saiu e foi a família que trouxe para ele. A contaminação está sendo domiciliar”, explicou.
Orientação: Desde a última semana, a orientação é que pessoas que tiveram contato com alguém que foi infectado com o coronavírus procurem a Unidade Sentinela para realizar um teste.
De acordo com Luciane, as pessoas têm procurado a Unidade Sentinela que agora está no Estádio Municipal Abrahm Nagib Nejm. “Eles estão procurando. Eles não têm vergonha de chegar e dizer: ‘Viu, eu fui contato positivado. Eu vim fazer o exame’. É isso que a gente quer. Que eles não tenham medo e que eles venham. A gente não vai cobrar. A gente não vai maltratar. ‘Ah, foi em tal parte’. A gente quer salvar, a gente quer ganhar desse vírus”, disse.
A enfermeira destaca que é preciso que as pessoas procurem a unidade nos primeiros sintomas e que não tenham medo de ir procurar diagnóstico. “Ame mais. Ame mais a sua família. Conviva mais. Faça o isolamento. Não tenha medo achando que entrou aqui e vai ser entubado. Não é! É a necessidade que, às vezes, leva para salvar a sua vida. Mas procure a unidade sem medo, venha conversar, venha tirar dúvidas”, destaca.
Para Ieda, as pessoas estão mais conscientes, mas ela reitera que é preciso cuidado na prevenção, especialmente de jovens que tem sido o grupo mais atingido nos últimos meses. “No passar dos dias as pessoas foram entendendo mais como o Covid funcionava, como a contaminação se dava e hoje temos um pouco mais de conscientização. Mas, principalmente, os jovens, os mais moços, que pensam que estão perdendo a vida deles, que não tem diversão, que eles não podem sair, que eles segurem um pouco mais. Se Deus quiser essa pandemia vai passar e quando tudo isso acabar, vão voltar as festas, os encontros, as aglomerações e nós vamos poder viver nossa vida plenamente, sem risco”, disse.