Santa Casa de Irati registra prejuízo de mais de R$ 460 mil por mês

Como forma de protesto, hospital suspendeu cirurgias eletivas nesta terça-feira, 19. Movimento faz parte da…

19 de abril de 2022 às 16h22m

Como forma de protesto, hospital suspendeu cirurgias eletivas nesta terça-feira, 19. Movimento faz parte da campanha “Chega de Silêncio”, que visa conscientizar a comunidade sobre os problemas enfrentados pelas Santas Casas por conta da defasagem na tabela do SUS/Paulo Henrique Sava


Sidnei Barankievicz, diretor administrativo da Santa Casa de Irati, apresenta situação financeira do hospital a um grupo de funcionários. Foto: Paulo Henrique Sava

A Santa Casa de Irati vem registrando prejuízos mensais acima de R$ 460 mil. Como forma de protesto, o hospital suspendeu a realização de cirurgias eletivas nesta terça-feira, 19. O movimento faz parte da campanha “Chega de Silêncio”, que visa conscientizar a comunidade sobre os problemas enfrentados pelas Santas Casas em todo o Brasil por conta da defasagem da tabela de preços pagos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) por diversos procedimentos realizados pelos hospitais.

Dados apresentados pela diretoria da Santa Casa apontam que o hospital tem uma receita mensal de R$ 2 milhões e 130 mil, ao passo que as despesas somam R$ 2 milhões e 626 mil, o que gera um prejuízo de R$ 462 mil todos os meses. Além disso, as Santas Casas são vistas pela população como locais de assistência à saúde por parte do SUS. Por este motivo, o provedor e diretor técnico da Santa Casa, Ladislao Obrzut Neto, acredita que os hospitais não estão sendo remunerados adequadamente pela prestação dos serviços.

“Nós temos um prejuízo muito grande em todas as Santas Casas do Brasil, o que quase inviabiliza o funcionamento. O que vem acontecendo é que estas dívidas estão trazendo cada vez mais dificuldades de trabalho e atenção para a população. Nós passamos durante a pandemia por uma situação mais ou menos regular, saímos graças a Deus aqui em Irati com uma situação relativamente tranquila, tanto a Secretaria de Saúde quanto a Santa Casa trabalharam bem nesta pandemia. Agora, voltando as atividades normais, retornaram os problemas financeiros”, frisou.

Entre os principais fatores apontados como causas do aumento do prejuízo financeiro da Santa Casa, estão o reajuste de 11% no preço dos medicamentos, autorizado pela Anvisa e a bandeira vermelha nas contas de luz, que afetou todos os brasileiros. Além disso, está tramitando no Congresso Nacional um projeto de lei que reajusta o piso salarial da enfermagem. Caso a matéria seja aprovada, na opinião de Ladislao, isto inviabilizaria o atendimento por parte dos hospitais filantrópicos. O provedor da Santa Casa explica o que pode acontecer com o prejuízo do hospital se a diretoria for obrigada a aplicar os reajustes.

“Se passar este piso salarial, o prejuízo vai para R$ 1,8 milhão a quase R$ 2 milhões. Tem ainda mais o reajuste da enfermagem pedido pelo Sindicato (dos Empregados em Estabelecimentos de Saúde de Irati e Região) de 15%, o que vai dar em torno de mais R$ 600 mil. Então, sem nada hoje temos R$ 462 mil (de prejuízo). Qual é a empresa dentro de Irati, com 320 funcionários, que permanece com suas portas abertas 24 horas e aos sábados, domingos e feriados e que tem um prejuízo destes? Que eu conheço é só a Santa Casa. A dificuldade está na nossa remuneração. Quem nos paga é o SUS, que é dos governos estadual e federal”, comentou.

O provedor acredita que a notícia sobre a falta do recursos para os reajustes não foi bem recebida pelos funcionários da Santa Casa. Mesmo assim, ele demonstrou otimismo e acredita que a situação será resolvida em breve. “Saber que não tem recursos para aumentar salários, na situação em que estamos, com uma inflação de dois dígitos, fica difícil. Eu coloquei para eles que a situação tende a se resolver, inclusive a Santa Casa não é uma instituição que visa lucro, mas ela não pode trabalhar no prejuízo, porque é uma situação conflitante, trabalhar e ainda ter que tirar dinheiro para manter o sistema de saúde”, pontuou.

Provedor e diretor técnico da Santa Casa, Ladislao Obrzut Neto, apontou que principal fonte de recursos do hospital é a Tabela SUS. Foto: Paulo Henrique Sava

Municípios – Prefeitos da região da AMCESPAR se comprometeram, em reunião na última semana, a conversar com deputados estaduais e federais para que haja um movimento no sentido de reajustar os valores pagos pelo SUS às Santas Casas por conta dos procedimentos realizados nestes hospitais. Além disso, no final do mês de abril, será realizada a Marcha dos Prefeitos em Brasília, movimento do qual a Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CMB) irá participar para reivindicar uma solução para este impasse.

Entre os municípios da região, Irati repassa mensalmente R$ 100 mil pelos procedimentos realizados pela Santa Casa. No entanto, este convênio deve durar apenas mais um mês, se não houver prorrogação. Em relação aos demais, a direção do hospital alegou que não há qualquer tipo de repasse além do que já é feito pelo Consórcio Intermunicipal de Saúde (CIS/Amcespar). A alegação dos prefeitos, segundo Ladislao, é de que há dificuldade em justificar os pagamentos feitos diretamente à Santa Casa para o Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR).

“Todos os prefeitos colocam que a dificuldade está em como justificar este repasse para a Santa Casa frente ao Tribunal de Contas. Eles se comprometeram em ver junto aos seus assessores e secretários de finanças como isto poderia ser feito. O básico foi a questão da movimentação com os deputados, o que é importante”, frisou.

Procurado pela nossa reportagem, o presidente da Amcespar e prefeito de Inácio Martins, Júnior Benato, explicou que todos os municípios contratam serviços através do CIS/Amcespar. Ele ressalta que cada município deve avaliar se há necessidade ou não de contratar mais serviços junto à Santa Casa. “Precisa ver se o município necessita aumentar seus procedimentos  de contratualização. Neste caso, nós não precisamos. Irati talvez precise e aumentou o repasse, ou está repassando um valor de R$ 100 mil que vai ser temporário. Então, neste período, talvez eles estejam precisando de mais ofertas de serviços e contrataram. Agora, isto é muito questionável através das procuradorias jurídicas dos municípios. Nós temos um repasse financeiro através do CIS, que é um procedimento correto. Não vamos entrar no mérito de como Irati está fazendo, e com certeza o seu jurídico deve ter encontrado a legalidade”, frisou.

Além do movimento desta terça-feira, conversas e movimentos serão realizados por parte da Federação das Santas Casas de Misericórdia e Hospitais Beneficentes do Estado do Paraná (FEMIPA) e da CMB, a nível estadual e federal.

Defasagem – A tabela de valores pagos pelo SUS pelos procedimentos está defasada desde 2013. Nos últimos nove anos, o órgão somente reajustou sua tabela em 93%. Entretanto, este reajuste deveria ser de pelo menos 1400% ao longo deste período, segundo a diretoria da Santa Casa. O diretor administrativo, Sidnei Barankievicz, comparou a situação do hospital à de um trabalhador que não recebe reajuste salarial há quase 10 anos. 

“Qualquer um que receba um salário fixo mensal, se hoje estivesse recebendo o que recebia há 10 anos atrás sem nenhum reajuste, dificilmente teria condições de se manter. É o que está acontecendo com a Santa Casa há quase 10 anos, sem reajuste e tendo que arcar com todos os custos que aumentaram nesta década, como luz, medicamentos, material, alimentação, limpeza e principalmente o salário, que é o que mais pesa. Todas as Santas Casas têm mais de 50% do custo mensal com o salário dos funcionários. Todos os anos os reajustamos, mas sem o reajuste nos repasses dos governos estadual e federal, o atendimento está se tornando inviável porque os custos têm aumentado cada vez mais”, comentou.

Para manter as portas abertas mesmo com este prejuízo mensal, a Santa Casa parcelou dívidas com a Copel, pagamento de impostos, INSS, FGTS, impostos retidos dos honorários médicos, o que agrega juros aos custos mensais da Santa Casa. A diretoria do hospital ainda não se reuniu para discutir o que será feito caso a situação financeira não seja resolvida nos próximos meses. Entretanto, algumas Santas Casas do Paraná não conseguirão manter suas portas abertas. “Nós não sabemos qual será o desfecho aqui em Irati ou em outras Santas Casa, mas a previsão da Federação é de que alguns hospitais filantrópicos não conseguirão manter as portas abertas”, lamentou Sidnei.

Sidnei questionou para onde iriam os pacientes que precisarem de atendimento médico-hospitalar, caso a Santa Casa de Irati tenha que fechar as portas. “Para onde vão estes pacientes? Ponta Grossa estará numa situação difícil, assim como Guarapuava, e não receberão pacientes. A situação vai ser de nível nacional, pois ela está muito alarmante para todo o contexto da saúde pública no Brasil. Por isto, estamos fazendo este movimento hoje, para ver se conseguimos sensibilizar os governantes para que seja revisto este valor dos hospitais”, finalizou.

Funcionários da Santa Casa acompanham explanação da diretoria sobre as dificuldades do hospital. Foto: Paulo Henrique Sava

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