Santa Casa de Irati adere a movimento nacional e promove paralisação

Protesto expressou sentimento de “luto” decorrente da situação das Santas Casas e hospitais filantrópicos brasileiros…

26 de setembro de 2014 às 11h39m

Protesto expressou sentimento de “luto” decorrente da situação das Santas Casas e hospitais filantrópicos brasileiros


Da Redação, com reportagem de Sassá Oliveira

Servidores da Santa Casa cruzaram os braços na manhã desta quinta (25) em adesão ao movimento nacional que objetiva expressar o sentimento de “luto” pela crise que as santas casas e hospitais filantrópicos do Brasil estão passando. Segundo os administradores das instituições de saúde brasileiras, a crise enfrentada pelos hospitais decorre do subfinanciamento do Sistema Único de Saúde (SUS).

O valor da dívida é praticamente igual ao que o governo federal destinou para a saúde básica no país neste ano: R$ 18,1 bilhões. A mobilização foi aprovada pelos participantes do 24º Congresso Nacional das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos realizado em Brasília (DF), em agosto.

No Paraná, os hospitais filantrópicos são responsáveis por mais de 50% dos atendimentos ao SUS e mais de 70% dos procedimentos de alta complexidade. São mais de 7 mil leitos ativos disponíveis ao usuário e cerca de 40 mil profissionais empregados diretamente.

Reivindicações

O setor propõe ao Ministério da Saúde a implementação de medidas para ampliação do custeio da média complexidade, estabelecendo novo Incentivo à Contratualização (IAC) correspondente a 100% do valor contratado com o SUS, para todos os hospitais do segmento; a criação de incentivo para o custeio da alta complexidade, com estabelecimento de IAC que corresponda, no mínimo, 20% do valor contratado com cada hospital nesta área; a ampliação do IAC cumulativo para os hospitais de ensino para 20%, bem como, destinação de recursos para pagamento da integralidade de bolsas de residências médicas, hoje sob responsabilidade destas instituições; a ampliação do Programa de Fortalecimento das Entidades Privadas Filantrópicas e Sem Fins Lucrativos (PROSUS) para soluções de dívidas com o sistema financeiro, alcançando juros máximos de 2% ao ano e prazos mínimos de 180 meses, com carência de três anos; a criação de linha de recursos de investimentos, a fundo perdido, aos moldes do REFORSUS, tanto para tecnologias como para adequações físicas.

O provedor da Santa Casa de Irati, Germano Strasmann, defende que o protesto é uma forma de lutar pela sobrevivência da entidade, em busca de uma forma de assegurar um salário justo para os médicos, que recebem em média 30% menos que profissionais da saúde concursados em prefeituras da região e que, por conseguinte, acabam encaminhando os pacientes para o hospital logo após a consulta. “Isso é quase regra geral, é costume e isso nos inviabiliza, sem contrapartida financeira, para fazer este tipo de procedimento”, complementa Strassmann.

O provedor aponta que o governo federal enviou R$ 280 mil ao hospital, mas que caíram na conta da Prefeitura de Irati. “Já conversamos com o prefeito e com as autoridades estaduais e federais, inclusive com gente famosa que representa a nossa região. Até hoje ninguém conseguiu uma solução e sequer uma explicação para nós. Só nos restam os meios judiciários, mas não queremos criminalizar essas situações”, reclama.

Outra situação que Strassmann indica é o fato de ter que remover pessoalmente um ponto de táxi, com auxílio de funcionários, porque isso poderia prejudicar o andamento das obras pelas quais o hospital está passando. “Não ia perder um investimento de R$ 2 milhões, que é para atender melhor à população de Irati e região que fosse inviabilizado simplesmente porque todo mundo tem preguiça de fazer qualquer coisa pela Santa Casa. Todo mundo se omite, todos, de uma maneira geral”, desabafa.

Ele reclama também da falta de interesse da comunidade pela questão, ao citar que a Irmandade da Santa Casa, que deveria reunir 70 pessoas possui, no máximo, 20. 

Strassmann cita que o hospital poderia ser beneficiado pelo PROSUS – Programa de Fortalecimento de Entidades Privadas Filantrópicas e das Entidades Sem Fins Lucrativos que Atuam na Área da Saúde e que Participam de Forma Complementar do SUS. No entanto, segundo o provedor, o programa só atenderia aos hospitais em situação financeira crítica e a Santa Casa não se enquadraria neste critério. “Não estamos quebrados, só estamos devendo algumas contas. Para se inscrever nesse programa, que realmente é interessante, com longo prazo e juros baratos, mas é para quem está quebrado”, comenta.

Na visão de Strassmann, o Prosus beneficiaria os hospitais que sequer teriam condições de saldar as dívidas, pois deveriam até R$ 300 milhões em tributos e contribuições sociais. “Temos tudo em dia, tanto que conseguimos certidões negativas e ainda conseguimos fazer convênios com o Estado, com a Prefeitura, com a União. Para não degringolar de vez que resolvemos aderir ao movimento nacional. Na verdade, o objetivo é chamar a atenção das autoridades, independente do tamanho do poder, que se interessem um pouco pela Santa Casa de Irati. É o último socorro que temos na região”, observa.

O administrador da Santa Casa, Sidnei Barankevicz também comentou sobre a situação que as instituições estão enfrentando. “Hoje está em torno de R$ 16 bilhões de dívidas acumuladas com todas as Santas Casas e hospitais filantrópicos. Creio que não deva ser muito diferente de Irati. A proporção, com certeza, muda, mas o sistema deve funcionar igual”, opina. De acordo com Barankevicz, o endividamento se sustenta no fato de quem em novembro deve ser repassada a data-base aos profissionais e, pela lei, deve corresponder minimamente ao INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor).

No entanto, para que seja possível assegurar o reajuste dentro do percentual exigido, o administrador aponta que seria necessário sacrificar o pagamento de algum tributo ou de algum financiador. Vulgarmente, seria “despir um santo para cobrir o outro”. “Para pôr em dia o tributo, nos obrigamos a pagar multas, buscar empréstimos, financiamento em bancos. E isso tudo vai virando uma bola de neve. O importante de realmente termos um reajuste na tabela SUS ou termos um reajuste no repasse dos incentivos, melhora significativamente”, avalia. 

O presidente do sindicato dos Profissionais da Área de Saúde de Irati, Mário Cordeiro, manifestou seu descontentamento com a situação enfrentada pelas instituições. Segundo ele, o endividamento das Santas Casas decorre da absorção de custas e por falhas nos repasses dos municípios, do Estado e da União. “Hoje eles pagam R$ 10 por uma consulta. O médico fica com R$ 7,50 e R$ 2,50 ficam para o hospital. De onde que o hospital vai conseguir pagar o funcionário, a estrutura, a luz, que subiu um absurdo agora esses dias? As empresas vão conseguir pegar esse aumento da luz e repassar em cima do contribuinte e a Santa Casa vai fazer o que, se é 90% de [atendimento via] SUS?”, questiona.

Entenda a crise
Com base nas análises de centros de custos de três grandes Santas Casas – Maceió, Belo Horizonte e Porto Alegre -, referências de gestão, volume assistencial e qualidade no atendimento, a Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CMB) calculou a dimensão do déficit do setor, que chega a 232% nos resultados econômicos de internação da média complexidade (SIH-SUS). A alta complexidade, que sempre apresentou um financiamento compatível, já acumula, no entanto, um resultado negativo mensal de 39%, e os custos ambulatoriais com déficit de 110%.

Para chegar a esses resultados, os hospitais reuniram os chamados subgrupos de alta e média complexidade e o atendimento ambulatorial de um mês, apontando os custos e as receitas provenientes do contrato com o SUS. Mesmo lançando os incentivos federais e estaduais, resultados de políticas de governo, e que são feitos apenas para uma pequena parcela de hospitais contratualizados, o déficit atinge 41% na média complexidade, mais de 42% no ambulatorial e mais de 10% na alta complexidade. Outro dado alarmante é o déficit nas diárias de UTI. A Santa Casa de Belo Horizonte, por exemplo, apurou mais de 297% de defasagem.

O montante total de R$ 15 bilhões em dívidas, dos quais 44% com o sistema financeiro, 26% com tributos federais, 24% com fornecedores e 6% com passivos trabalhistas e outras, não terá resolução apenas com o PROSUS, até então, restrito às dívidas com tributos federais, remanescendo a preocupação com a amplitude e total incapacidade de enfrentamento das demais dívidas.
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