Pressionado, delegado iratiense desiste de participar da Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres

Thiago Vinícius Matoso Gorte alega ter sido discriminado por ser o único homem entre outras…

11 de janeiro de 2016 às 11h15m

Thiago Vinícius Matoso Gorte alega ter sido discriminado por ser o único homem entre outras 143 delegadas na Conferência Estadual

Da redação, com reportagem de Paulo Henrique Sava


O assistente administrativo no Centro Administrativo Municipal (CAM) de Irati, Thiago Vinícius Matoso Gorte, iria representar o Conselho Municipal dos Direitos da Mulher na 4ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, em Brasília, entre os dias 15 e 18 de março. Gorte já participou, no início de dezembro, da IV Conferência Estadual de Políticas para as Mulheres do Paraná, que ocorreu no “Estação Eventos” – salão social do Shopping Estação, em Curitiba. Na ocasião, o único delegado ao lado de outras 143 delegadas na Conferência Estadual.

Gorte foi eleito delegado na Conferência Municipal e, depois, na Estadual. Contudo, ele desistiu de participar da Conferência Nacional, em Brasília, em março. “Fui eleito aqui em Irati como representante da Rede de Proteção para ir à Conferência Estadual. Na Estadual, participei de toda a Conferência e lá tinha um momento em que iam eleger os representantes para irem até a Conferência Nacional, em março. No momento da eleição, eu me candidatei e tive os votos necessários para representar o Estado do Paraná na Conferência Nacional. Logo depois da eleição, alguns movimentos que estavam participando da Conferência, em especial a APP-Sindicato, vieram conversar comigo para que eu desistisse da vaga e que não era para eu ir porque eles achavam um absurdo um homem representar o Paraná para lutar pelos direitos das mulheres. Acontece que eram 144 vagas para ir à [Conferência] Nacional e, dessas 144 vagas, eu era o único homem eleito. Então, teríamos 143 representantes mulheres e eu seria o único homem eleito para ir”, relata.

Segundo ele, os movimentos que questionavam sua eleição para a Conferência Nacional alegaram que ele estaria retirando a vaga de uma mulher. “Me pressionaram a ponto de eu desistir, porque, se eu insistisse, elas iriam repudiar e que, se eu fosse para a Plenária, iriam me hostilizar”, afirma Gorte.

O delegado decidiu, a princípio, conversar com as demais Secretarias e órgãos que integram a Rede de Proteção, em Irati, para definir o que poderia ser feito a esse respeito. Depois, conversou com a presidente da Conferência Estadual, que respondeu que nada faria para defendê-lo, pois representa o movimento feminista e que não pretendia se indispor por causa de uma pessoa só. 

“Foi também questionado com a comissão jurídica e com a equipe técnica da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social (SEDS-PR), que estava presente, e eles falaram que eu poderia me candidatar, que era legal e que no decreto da Dilma (de 30 de março de 2015), tem essa disposição ‘delegados’ e ‘delegadas’ [no artigo 5º], e que eu poderia ir para a Conferência Nacional. Mas o Conselho Estadual não iria se manifestar para não se indispor com seus representantes. Me tiraram da Plenária, não participei, e acabei desistindo da vaga justamente para evitar que elas me hostilizassem, como já estavam me hostilizando, mas elas iriam fazer uma hostilização pública”, argumenta.

O assunto foi trazido para a reunião subsequente do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher, que foi unânime em repudiar a atitude do Conselho Estadual, em não tomar posicionamento. “Acreditamos que, para ser feminista, não é necessário ser mulher, que todos podem lutar por esses direitos. E o Conselho me apoiou e fizemos um pedido de reconsideração, para reconsiderar essa vaga, que era minha, por direito, mas acabei tendo que desistir por pressão. Fizemos esse pedido e encaminhamos ao Conselho Estadual, repudiando o ato deles, e ao Conselho Nacional, para que analisem essa questão. O Conselho Nacional respondeu dizendo que vai passar na reunião de fevereiro e eles verão quais atitudes vão tomar, até para revisar a questão da minha vaga”, afirma Gorte.

A partir de agora, o delegado vai reivindicar que o município de Irati seja representado na Conferência Nacional, uma vez que ficou sem a vaga obtida, a partir de sua desistência. Toda a região Centro-Sul, aliás, deve ter apenas um representante se a situação se mantiver. “Irati não tem nenhum representante que vai para a Conferência Nacional. Não em meu nome, mas em nome do município, porque acredito que é um direito do município. Eu consegui a vaga em nome do município e é por esse direito que eu devo lutar, para que Irati também tenha representação em Brasília no dia da Conferência Nacional”, comenta.

A suposta discriminação do movimento feminista dentro da Conferência Estadual contra o delegado iratiense teria começado a partir do momento em que ele deixou de concordar com algumas das propostas apresentadas. Gorte considerou “radical” a proposta de reserva de 50% das vagas em concursos públicos para mulheres, por exemplo.

A presidente em exercício do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Irati, Maria Renata Menon, salienta que já foi divulgada uma nota em que o Conselho repudia a atitude tomada contra o delegado que representa o município de Irati. 

“Ele foi atacado por algumas delegadas que estavam participando dessa Conferência, quando ele foi candidato a delegado para a Conferência Nacional e foi eleito por todos naquela Conferência Estadual. “Ficamos muito decepcionados. O Conselho da Mulher de Irati está sendo reativado em 2016; foi realizada a Conferência em 2015. Esse Conselho estava desativado há alguns anos. O município de Irati encaminhou uma nota de repúdio ao Conselho Estadual, por também este não ter tomado nenhuma providência no momento da Conferência. Nenhum conselheiro estadual, nem a Comissão Organizadora da Conferência tomou alguma providência quanto a essa discriminação que o Thiago sofreu lá em Curitiba”, reclama Maria Renata.

Ainda de acordo com a presidente em exercício do Conselho Municipal, a mesma reivindicação foi enviada para o Conselho Nacional, que já respondeu ao e-mail, informando que vai cobrar providências quanto ao caso, uma vez que o decreto assinado pela presidente Dilma Rousseff convocando a Conferência Nacional permite a participação tanto de delegados quanto de delegadas (confere com o parágrafo único do artigo 5º).

“Não teria motivo nenhum para o Thiago não participar da Conferência Nacional, até porque serão discutidas Políticas Públicas para Mulheres e não necessariamente apenas mulheres têm que estar envolvidas nessa causa. Acho muito importante a participação dos homens nas causas feministas. Ficamos muito tristes com isso que aconteceu. O Conselho Municipal é solidário ao Thiago, que acabou desistindo da vaga. Pedimos dentro dessa nota que seja revertida sua vaga na Conferência Nacional, visto a importância da participação dele sendo o único representante homem aqui da nossa região. Teremos também representantes mulheres, daqui do município de Irati, mas a participação dele, depois de toda essa situação, é ainda mais importante para ele levar essa questão de igualdade de gênero e a participação dos homens dentro do debate das políticas públicas para mulheres para a Conferência Nacional. Esperamos que a comissão organizadora da 4ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres reverta a vaga”, reitera Maria Renata.

A reportagem da Najuá procurou a diretoria do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher, mas até agora ninguém respondeu nossos e-mails nem retornou as ligações.


Este site usa cookies para proporcionar a você a melhor experiência possível. Esses cookies são utilizados para análise e aprimoramento contínuo. Clique em "Entendi e aceito" se concorda com nossos termos.