Município alega que Associação de Catadores Nossa Senhora Aparecida atua sem licenças, com caminhão inapropriado e trabalhadores estão em condições irregulares
Da Redação, com reportagem de Paulo Henrique Sava
A Prefeitura de Teixeira Soares acusa a Associação de Catadores Nossa Senhora Aparecida, que faz a coleta de recicláveis no município, de atuação irregular. Entre os motivos alegados pela Procuradoria do Município, estão a falta de licenças, o uso de caminhão inapropriado para a finalidade, e que trabalhadores também estariam em condições inadequadas. O processo está em trâmite na Promotoria do Ministério Público do Paraná (MP-PR), em Teixeira Soares. A promotora Ana Caroline Monteiro de Moraes preferiu não gravar entrevista sobre o assunto.
Segundo o procurador do Município de Teixeira Soares, Levi Varela da Silva, a Associação de Catadores Nossa Senhora Aparecida não possui documentação da Prefeitura, ou seja, uma licença, que autorize seu funcionamento. Levi relata que a associação foi formada durante a gestão anterior, através de dispensa de licitação, com membros de uma associação de reciclagem que existia em Irati.
“A dispensa de licitação era para a destinação de recursos, mas não o que se destina hoje, que são destinados caminhão, combustível, motorista e manutenção do caminhão. Na verdade, a [dispensa de] licitação foi realizada exclusivamente para repassar recursos”, frisa o procurador. De acordo com ele, o contrato tinha sido feito, inicialmente, para 12 meses: de novembro de 2016 a novembro de 2017.
Com uma errata, o prazo foi encurtado para apenas dois meses: novembro e dezembro de 2016. Ao longo desses dois meses, a Prefeitura ficou encarregada de repassar pouco mais de R$ 9 mil à associação e chegou a repassar cerca de R$ 7,3 mil, divididos em duas parcelas pagas em 23 e 27 de dezembro. “De lá para cá, a associação segue funcionando de forma irregular”, afirma.
Levi alega que há um inquérito civil público (nº 000272201609007/4) no Ministério Público do Trabalho, em Guarapuava, que investiga eventual irregularidade da Miroplast. “Na verdade, essa empresa acabou sendo denunciada por ato e ação da associação e não Miroplast”, afirma. Segundo o procurador, a empresa conseguiu reverter o processo a seu favor ao provar que não há irregularidade sendo praticada na Miroplast e quem eventualmente pode ter praticado irregularidade é a associação.
O procurador contesta também a validade da licença ambiental da associação, que funcionaria em local diferente do indicado no documento. A licença indica que a associação funcionaria na PR-438, próximo ao Rio das Almas quando, na verdade, fica situada no Centro de Teixeira Soares. A associação chegou a funcionar, de fato, às margens da PR-438, em seu início, mas a licença foi obtida em junho de 2017, quando já tinha mudado de endereço.
De acordo com Levi, a intenção do Município não é desmanchar a associação. Porém, estuda a possibilidade de procurar por parceiros que executem o serviço sem depender de recursos financeiros cedidos pela municipalidade. Caberia à Prefeitura, nesse caso, fornecer apenas o caminhão para a coleta e o motorista, enquanto a associação seria responsável pelos funcionários para recolher o material reciclável.
A Procuradoria do Município questiona, ainda, as condições de trabalho dos dez catadores, que receberiam menos de um salário mínimo ao mês. A associação defende que os catadores são todos sócios e dividem o lucro mensal da venda do material coletado.
“Passamos a averiguar essa situação a partir do momento em que a promotora Ana Caroline [da Comarca de Teixeira Soares] oficiou o Município para que o prefeito respondesse a determinadas situações relacionadas à associação. Quando o prefeito me passou isso, para que eu verificasse, aí que verificamos todas essas irregularidades e anormalidades”, diz.

Associação afirma funcionar em condição regular
O presidente da Associação de Catadores Nossa Senhora Aparecida, Laionel Ricardo dos Santos, defende que a licença cedida pelo IAP é regular e que consta nela também o endereço atual (Rua Lourenço Serenato, 520) e que o endereço anterior se refere à época da abertura da associação.
Laionel relata também que a contribuição ao INSS está em processo de regularização e que cada associado contribuiria individualmente.
Quanto ao uso dos equipamentos de proteção individual (EPIs), o presidente da associação cita que o Provopar forneceu o material, mas que as luvas se desgastam com o uso e que a associação não dispõe de capital para reposição. Da mesma forma, o caminhão-baú cedido pela Prefeitura enfrenta problemas mecânicos e teria enguiçado no meio do caminho na semana passada; foi necessário empurrar o veículo.
O Ministério Público deu o prazo de 15 dias, que se encerra na próxima semana, para que a associação apresente a papelada exigida para regularizar a atividade – como a licença de funcionamento, a licença ambiental e as comprovações de estar em dia com o INSS.
Já em relação à divisão dos lucros entre os associados, que é contestada pela Prefeitura, o presidente da Associação alega que o procedimento adotado é o mesmo que era aplicado na Associação Malinoski, em Irati.
A Associação de Catadores espera entrar em acordo com a Prefeitura. “Na verdade, nós dependemos. Se ela não ceder mais o caminhão, nem ajudar com o aluguel do barracão, não temos mais o que fazer e o certo seria fechar as portas e nove pessoas vão ficar sem emprego”, diz.
Laionel ressalta que todos os catadores são moradores de Teixeira Soares. Quatro dos associados vieram de Irati, segundo ele, mas se estabeleceram no município há um ano, para formalizar a situação e até o Título de Eleitor já foi transferido para Teixeira Soares.

Uma das integrantes da diretoria da Associação de Teixeira Soares, Luciane Blanski, relata que os problemas tiveram início no começo do ano, quando a associação foi em busca de apoio junto ao município, através da Secretaria de Meio Ambiente, para que o caminhão usado na coleta seletiva fosse consertado. Ele vinha apresentando problemas mecânicos – ainda não sanados – que oferecem risco à segurança dos catadores. Segundo Luciane, essa ajuda teria sido negada porque a Prefeitura quer fechar a associação, que estaria funcionando de forma irregular.
Conforme Luciane, diferente de Irati, onde a associação de catadores conta com o apoio do Jurídico da Prefeitura e da Secretaria de Meio Ambiente para funcionar regularmente, em Teixeira Soares não existe esse apoio. Os catadores resolveram recorrer aos vereadores em busca de ajuda e só três deles atenderam ao apelo e, mesmo assim, estão sendo criticados pelos pares, acusados de tentarem se sobressair usando a causa da associação.
Luciane argumenta que se a associação fosse irregular não teria conseguido doação de equipamentos do governo, como prensa, balança, carrinhos, entre outros. “Se uma associação está ilegal, como o governo do estado vai mandar ajuda? Não existe essa maneira. Se eles [a Prefeitura] querem fechar a associação e passar [a coleta de recicláveis] a um empresário, não sou contra, desde que façam uma licitação, como outras cidades fazem”, afirma.
De acordo com Luciane, há amparo legal para que as Prefeituras priorizem as associações e cooperativas na coleta seletiva. “Se houvesse uma licitação e um empresário local ganhasse, ele teria que dar destino final ao rejeito e ao reciclável”.

Luciane opina que isso não ocorreria: o empresário local usaria o material, faria o processamento e faria lucro para si, sendo que o barracão onde esse empresário estaria instalado seria cedido em comodato pela Prefeitura, que cederia a esse empresário o caminhão, o motorista e o diesel. “Por que tirar a associação, que está fazendo o trabalho sem dar custo ao município e pegar um empresário que vai dar custo?”, questiona.
Ela torce para uma resolução entre as partes, o que, na opinião de Luciane, dependeria apenas da boa-vontade da Prefeitura em chegar a um consenso com a associação e renovar o contrato, tendo em vista que a associação continuou a prestar um serviço importante durante todo esse tempo.
Ouça abaixo o áudio completo da reportagem.