Os bares de Irati

O Programa Irati de Todos Nós é idealizado por José Maria Grácia de Araújo e…

29 de agosto de 2011 às 14h39m

O Programa Irati de Todos Nós é idealizado por José Maria Grácia de Araújo e vai ao ar pela Najuá AM, todos os sábados, às 14 horas.

O tempo é algo que não podemos controlar. Se, quando ainda jovens, desejávamos que ele passasse rapidamente e com muito agito; agora, quando adultos, queremos que, aquele mesmo tempo de outrora, flua tranqüila e morosamente.

Mas nem no passado, como também no presente, nossas vontades não exercem a mínima influência na forma com que o tempo passa por nossas vidas. Temos de nos sujeitar aos seus caprichos.

Quando estava preparando o material que usaria no meu programa deste sábado, ao verificar a data de hoje (30.07.2011) tive uma sensação de surpresa e espanto, quando notei que já estamos a cinco meses do final de mais um ano. Ano vem, ano vai… e o tempo continua o seu perpetuo caminho pelos meandros da vida. O tempo que nos leva a reviver múltiplas recordações inesquecíveis da nossa infância, adolescência, juventude e maturidade. Lembranças que nos fazem voltar no inexorável calendário de momentos tristes ou alegres de nossas vidas. Que fazer, além de tentar domá-lo e absorvê-lo da forma mais alegre e harmoniosa possível.

O MEU BOA TARDE A TODOS, desejando que vossos corações estejam repletos de toda a paz e o amor que nos foram legados como herança por aqueles que nos antecederam na grandiosa luta pelo engrandecimento da terra em que hoje vivemos. Nosso querido RIO DE MEL – IRATI

Já há alguns meses tenho sido cobrado pelo meu grande amigo Odair Moselle para que aborde um dos assuntos que me são muito gratos. “Araújo, porque você não fala, em um de seus programas, sobre os muitos bares que existiram em Irati, nos quais nos divertíamos jogando bilhar, nos reunindo com amigos ou, simplesmente, passando algumas românticas horas de lazer?” me dizia ele.

Bem, amigo Odair, é chegada à hora de atender ao teu pedido. Vou falar hoje das minhas múltiplas lembranças sobre algumas “PEROLAS” que faziam parte do belo colar de atividades da historia iratienses, e que nos acalentaram em nossas horas de merecida descontração e muito, mais muito mesmo, calor humano e cordialidade.

Estou me referindo as “PEROLAS” das nossas atividades, esportivas, etílicas, românticas, glamorosas, políticas, intelectuais e, também, FOFOQUEIRAS. Refiro-me aos bares da nossa, inesquecível, IRATI do passado.
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Não classificarei estas PEROLAS em uma ordenação de importância, pois todas mereceriam aparecer nas jóias das mais ilustres damas das cortes reais. Farei então uma abordagem, muito pessoal sobre elas, sem me preocupar com a importância que cada uma representou no nosso romântico passado.
Iniciarei com a perola que, carinhosamente, conhecíamos como o BAR DO MALUF, talvez o recanto mais democrático que a sociedade iratiense costumava freqüentar. E tudo começou assim:

No ensolarado dia 05 de agosto de 1934, João e Helena Bader Maluf, mestres sorveteiros, acompanhados de seus oito filhos, desembarcaram em Irati para um breve descanso. Dona Helena bem merecia esta providencial interrupção na cansativa viagem que teria como destino final à cidade de Foz do Iguaçu, Grávida de seis meses era prudente que aqui pernoitasse e somente seguisse viagem no dia seguinte. Grandes famílias unidas na luta por ideais coletivos eram muito comuns no passado, e seu Maluf sabia muito bem disso.
Um a um, e muito assustados, todos, muito assustados, foram “apeando” do trem: Lorice, Zoraide, Chafiah     (a nossa querida  Sofia), Chafi, Maria de Lourdes, Nacim, Nagib (o inesquecível turrão Batata) e, ainda no ventre de dona Helena Nain.

© Araújo

A breve parada para o merecido repouso de Dona Helena iria mudar todo o destino da família Maluf. Quis o acaso que o Sr. João, ao percorrer a cidade, em um rápido passeio, encontrasse um patrício seu, o Sr. Nagib Nejm, que aqui já residia há alguns anos, e que em um rápido bate-papo lhe informou que Irati não possuía nenhuma sorveteria até então. Foi o que bastou para o seu Maluf mudar, por completo, os seus planos de viagem. Nascia então a primeira sorveteria de toda a região.

Em seu tradicional endereço, hoje ocupado pelo prédio da Caixa Econômica Federal a família Maluf iniciou suas atividades de fabricação de sorvetes. Como, naquele tempo, aqui em Iraty ainda não existiam geladeiras ou outro qualquer tipo de maquinas para fabricação de gelo, seu Maluf recebia da cervejaria Adriática de Ponta Grossa, vindos pelo trem, as barras de gelo que necessitava para produzir seus deliciosos sorvetes. Estas barras eram colocadas em barricas com serragem e duravam até uma semana sem derreter, quando então, era recebida uma nova encomenda do tão precioso produto: o GELO.

Crianças, jovens, adultos; torcedores do CAUO, do ISC, do América, simpatizantes da UDN, PSD, PTB, todos sempre estavam lá, confraternizando-se em perfeita harmonia. O esmero e a dedicação da família Maluf no atendimento de seus fregueses fazia com que o local sempre fosse pequeno para o número de freqüentadores. Num canto se viam crianças e jovens, saboreando deliciosos sorvetes de uva, abacaxi, banana, chocolate, creme, coco queimado, limão e outros sabores mais exóticos. Olhava-se para outro lado, e lá estavam os “marmanjos” atacando um prato de quibe e sorvendo, aos goles, uma deliciosa batidinha de limão “galego”. Tinha ainda, semente de abóbora torrada com sal e outros petiscos sensacionais.

Esta é apenas uma pequena parte da historia desta PEROLA que foi o Bar do Maluf e que deixou uma profunda saudade nos corações de muitos de nós iratienses que ali passamos intermináveis horas jogando conversa fora e cultivando grandes amizades.

© Araújo

A segunda PEROLA de hoje é Café do Tadeu, isso mesmo. O local era um misto de Bar e Café, aos moldes dos tradicionais pontos que na época serviam, durante o dia e parte da noite, um gostoso cafezinho, regado de um bom papo entre amigos.

O Bar do Tadeu surgiu quase na mesma época em que o glorioso Cine Theatro Central iniciou suas atividades, ambos eram partes de um mesmo todo. Cinema e cafezinho. Como, na época, os filmes projetados eram divididos em partes, a cada vez que uma dessas partes, ou rolos do filme, acabava, era necessário que a seção cinematográfica fosse interrompida, por alguns minutos, para que se procedesse à devida troca do carretel de filme, e toda a platéia podia então deixar seus lugares e dirigir-se ao aconchegante recinto do Café do Tadeu. O local  era contíguo à sala do cinema, e ali, então, fumava-se, batia-se um rápido papo, comentava-se o espetáculo que estava sendo assistido, tudo isso regado a um delicioso cafezinho moído na hora e preparado pelo Tadeu, proprietário da casa. Quando soava o sinal para o reinício da seção, então, todos voltavam para seus lugares. Isso se repetia, pelo menos, umas três vezes, a cada sessão cinematográfica.

No entanto, não era somente nessas ocasiões que o Tadeu tinha seu estabelecimento lotado, pois como sabemos todas as cidades do interior ou mesmo das capitais possuíam um ponto preferido para as reuniões das suas principais personalidades, durante as quais se debatiam os assuntos, esportivos, administrativos, políticos e econômicos do país, e, de preferência, as novidades e fofocas locais. Nestas ocasiões não podiam faltar os seus freqüentadores habituais e infalíveis. Em Irati, lá pelas décadas de 50/60 até 70, o bar do Tadeu era o ambiente escolhido por nove, entre deis personalidades iratienses, para curtirem esses momentos de cordialidade e descontração. Ali diuturnamente se formavam os grupos para o cafezinho, jogos de salão e adivinhação, e os intermináveis debates sobre a agenda do dia.

O Café do Tadeu é, portando, uma das PÉROLAS do nosso passado social. {04}
Como terceira PEROLA, desta mesma forma de lazer do passado iratiense, escolhi o Bar e Lanchonete Marabá. Este inesquecível local de reuniões da juventude dos anos 50/60, funcionava quase ao lado do Bar do Maluf, ali mesmo, na Rua 15 de Novembro.

Inicialmente administrado pela família Doniack, o Marabá funcionou como sorveteria, se tornando com isso o ponto preferido pelos casais de namorados que para lá se dirigiam quando desejavam curtir momentos românticos e degustar uma boa taça de sorvetes, ou um delicioso copo de frappé.
Mais tarde o estabelecimento foi adquirido pela família Halila, que sob a administração do meu querido amigo Lauro, deu continuidade às mesmas atividades anteriores, isto é, continuou oferecendo a seus freqüentadores, deliciosos sorvetes, lanches, bebidas e outras iguarias. Lá pelo final da década de 50, quando foram reiniciadas as atividades da Liga Iratiense de Futebol, e com isso, os campeonatos regionais foram reativados, o Bar Marabá, passou a ser o reduto preferido dos atletas do Irati Sport Club, pois o Maluf acolhia preferencialmente os jogadores do Clube Atlético União Olímpio. A qualquer hora do dia ou da noite, que se passasse pela frente do Bar Marabá, invariavelmente, se poderia avistar quase toda a equipe do ISC e no Bar do Maluf, que era visinho, os atletas do Olímpico. O Marabá era o ponto de encontro, de nos jogadores do Irati, para que fossemos apanhados para participarmos dos treinos da equipe. Em fim, o velho Marabá, foi parte da vida social, esportiva e sentimental, de muitos iratienses. É, portanto mais uma das PEROLAS sociais do nosso passado.

© Araújo

Bem em frente ao Bar do Maluf, hoje Caixa Econômica, ali na rua 15, no velho prédio que ainda ali esta, funcionou o Bar e snuck do Sr. Erasmo de Mello.

Este local era freqüentado por pessoas mais simples, que aquelas que costumavam freqüentar os outros três, que acabamos de comentar. Logo na entrada, em um salão frontal, funcionava o bar, com seu tradicional balcão, servido por inúmeras banquetas altas, onde se apinhavam seus freqüentadores, degustando uma cerveja ou um cálice de outra bebida destilada. Os assuntos tratados eram os mais variados, desde o futebol, pescarias, caçadas e outros assuntos triviais. Ao lado, encostado a parede, apareciam algumas cadeiras elevadas providas de almofadas em seus acentos e um suporte frontal para o apoio de um dos pés, que serviam para que alguns dos seus freqüentadores tivessem seus sapatos engraxados por algum dos moleques que ali faziam ponto todos os dias e, principalmente, nas noites de festas ou bailes.

QUER ENGRAXAR MOÇO? Quando os assuntos iam escasseando, os freqüentadores passavam para um outro salão, em um piso mais elevado, que ficava aos fundos do prédio.

Lá existiam inúmeras mesas oficiais para a prática da sinuca, e quase sempre todas ocupadas por alegres grupos, disputando uma agitada partida de carambola, snuck ou uma outra modalidade de disputa de suas preferências. Sendo uma das mais procuradas e que convencionou chamar-se de jogo da “VIDA”. Ai sim, é que o bicho pegava mesmo. O jogo da VIDA, como era chamado, era normalmente jogado a dinheiro, e cada participante utilizava-se de uma única bola para a qual era conferida três vidas e sempre que era jogada para dentro de uma caçapa uma de suas vidas era extinta. Os jogadores iam sendo eliminados sempre que sua bola fosse encaçapada por três vezes. Ganhava aquele que ficasse por último com, pelo menos, uma de suas vidas. Entenderam? As regras do jogo eram mais ou menos assim, porém o que predominava mesmo eram as anti-regras acertadas, entre si, por alguns jogadores mais malandros. Uma delas era chamada de TREMPE, situação em que dois contendores, veladamente, combinavam para um não prejudicar o outro e ao final dividirem a bolada do jogo. Quantas e quantas brigas e discussões aconteciam a cada jogo, eram incontáveis, porém tudo sempre terminava numa boa.

Um outro jogo, creio que inventado aqui mesmo em Irati, era o POQUER DA SINUCA. Jogo no qual se usavam todas as bolas numeradas de 2 á 7, mais as vermelhas que eram os coringas. O jogador que antes fizesse duas trincas e uma seqüência abiscoitava o dinheiro das apostas. Uma trinca podia ser feita pela repetição de três bolas de um mesmo número que fossem encaçapada e, a seqüência, como o próprio nome esta dizendo, era formada por três bolas de números seguidos, 2, 3 e 4 – 5, 6 e 7. Sendo a bola vermelha o coringa que podia ser utilizado em qualquer das composições já referidas: Uma bola 2, outra 3 e a vermelha (coringa), duas bolas treis e o coringa, e assim por diante, formavam jogos completos. Assim passavam seus dias, muitos jovens e adultos iratienses, jogando suas sinucas, no velho casarão da Rua 15 de novembro conhecido como Sinuca do Erasmo.

© Araújo

O prédio de dois pavimentos, onde foi o Bar do Gasosa
Bar do TURCO Ruana, eita! Buteko arretado esse, seo!

O Turco Ruana foi um dos personagens mais folclóricos do nosso passado. O endereço do seu estabelecimento etílico/causistico/sinuqueiro (esta é uma indicação minha), foi o mesmo que alguns anos depois foi ocupado pelo, também, folclórico Bar do Gasosa ali, bem ao lado das Casas Pernambucanas. Mesmo prédio, mesmos espaços, mesmas atividades, isto é, um misto de bar, salão de sinucas e “tribuna” da cidadania (onde muitas gerações de iratienses discutiam o passado, presente e, principalmente, o futuro da nossa Iraty, durante o reinado do Turco Ruana e, Irati com “I”, no reinado do velho amigo Gasosa.

Lembro-me, vagamente, que quando ainda na minha infância e adolescência, os mais assíduos freqüentadores do Bar do Turco, eram: O velho Breno, o Chô, Bolonha, Joel Gomes, Nêgo Zanone, Nêgo João. De uma geração posterior, na qual me incluo, posso citar: Meu grande amigo Boca, Biduca, Nêgo Pessoa, Nenê Abdala, eu próprio e tantos outros grandes amigos que minha, já cansada memória, não me deixa lembrar com clareza. Freqüentávamos o Bar do Turco, hora para,  furtivamente, tomar uma geladinha, outras vezes para  disputarmos, intermináveis, partidas de bilhar ou, somente, para jogarmos muita conversa fora. Eram horas e mais horas que passávamos debruçados sobre as mesinhas do bar ou das grandes mesas, cobertas por pano verde, do salão dos fundos, onde, também, muito às escondidas, jogávamos bilhar.

Ainda na existiam os “famigerados” computadores, nem ao menos os descartáveis televisores, os rádios eram muito raros, só nos restando, portanto, os jogos de salão, pescar, caçar, visitar a Rua da Mina, e outras cositas mais.

Bons tempos aqueles em que não se passava um só dia que não nós entrássemos com nossos amigos. Será que um dia, as novas gerações terão a oportunidade de, novamente, desfrutarem destas atividades que moldaram tanto nossas personalidades, pacatas, amistosas, românticas e despreocupadas.

Até o próximo sábado, que aqui estaremos mais uma vez para lhes contar um pouquinho mais da história da nossa terra e da nossa gente. Até lá

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