Visitas em cemitérios no dia de Finados podem ajudar a superar o luto

Psicóloga, padre e representante da comunidade espírita falam sobre a superação da perda de pessoas…

02 de novembro de 2023 às 17h28m

Psicóloga, padre e representante da comunidade espírita falam sobre a superação da perda de pessoas próximas/Paulo Sava

Flores colocadas próximo ao cruzeiro do Cemitério Municipal de Irati. Foto: Paulo Sava

O luto é um sentimento inerente do ser humano. Porém, algumas pessoas têm mais dificuldade de superar a perda de pessoas próximas, seja por ligação familiar ou qualquer outro laço afetivo.
A reportagem da Najuá procurou a psicóloga Daniele Pires Soares, o padre Hélio Guimarães e Marli Traple, representante da comunidade espírita, para abordarem a questão da superação do luto neste dia de Finados.

Psicóloga Daniele Pires Soares. Foto: Paulo Sava

Para Daniele, o luto, mesmo sendo um sentimento pelo qual todo ser humano vai passar um dia, ainda é algo que causa muita dor. “É um tema que é triste, machuca, mas que todos nós, enquanto humanos, passamos por isto. Algumas pessoas passam umas vezes mais, outras menos, algumas sentem de uma forma mais difícil, dramática e dolorosa, outras com menos intensidade, mas todos eles têm seus sentimentos”, frisou.

Na visão do padre Hélio, as pessoas têm uma certa dificuldade em lidar com a morte. Ele afirma que, para conhecer uma cultura, o primeiro lugar a ser visitado deve ser onde os mortos são enterrados. ”Ali está expressada sua fé e também a maneira como as pessoas encaram a vida e a vida após a morte. Por exemplo, algumas culturas enterram seus entes queridos em urnas, na posição fetal, acreditando que aquela pessoa iria nascer de novo, em uma outra vida. Outras culturas queimavam seus mortos acreditando que, ao se consumir esta morada terrena e ao subir da fumaça daquele corpo, esta alma ia para junto de seus antepassados, em uma realidade sobrenatural. Outras depositavam os corpos de seus mortos em pequenas barcas e lançavam ao mar, ao desconhecido, para que as pessoas fizessem a sua última viagem, ao encontro de seus antepassados. Assim é nas diversas culturas”, comentou.

Como superar a perda – Superar a dor da perda de uma pessoa próxima é algo muito delicado, segundo a psicóloga Daniele. “É algo muito delicado. Quando falamos que perdemos alguém, vamos ouvir muitas pessoas no nosso cotidiano dizendo que também perderam e superaram. Cada um é cada um, cada pessoa tem a sua maneira de agir e reagir, e algumas vezes não temos noção de como vamos trabalhar com toda esta situação. Como superar este luto depende de cada pessoa, do que ela representava para mim, do momento pelo qual estou passando. Às vezes, eu estou bem forte e fica mais tranquilo de assimilar, trabalhar e driblar esta situação. Tem momentos que não estou bem, que posso estar com uma depressão, com uma dificuldade emocional, e fica mais lenta, tensa e delicada esta perda”, comentou.

Na visão da psicóloga, a fé facilita todo o caminho de superação desta perda. “Não vai ser diferente você ter fé ou não ter, a dor vai existir da mesma forma. Quando temos fé, conseguimos enxergar as coisas com um olhar diferenciado, de horizonte. Então, eu sempre vejo assim: eu perdi esta pessoa, mas o que ela representou para mim? O que ela fez de importante e o que eu fiz de tão bem para ela? Eu vejo como gratidão: eu sou grata porque esta pessoa viveu um tempo do meu lado, plantou algumas sementes, colhemos juntos muitos frutos e aprendemos com erros e acertos. Existe um momento de gratidão, e quando conseguimos olhar desta forma, fica mais leve o fardo da perda e do sofrimento de mão ter mais (aquela pessoa)”, comentou.

Para Daniele, a saudade de uma pessoa querida que faleceu nunca passa. “Podem passar 20, 30, 40 ou 50 anos, e você vai lembrar perfeitamente daquele sorrisinho, do jeitinho que a pessoa comia, do que ela fazia, como sentava, como brigava, das roupas que ela usava. Tudo faz lembrar com muito amor e carinho”, pontuou.

Morte de filhos – Já para os pais que perdem seus filhos, a superação da perda é ainda mais difícil, segundo Daniele. “Isto não é o natural da vida, que seria os mais novos enterrarem os mais velhos, que seriam os pais, os avós, e já é difícil. Nenhuma perda é fácil, não existe idade, tamanho, tempo, não existe isso, ninguém está preparado para isto e não sei se algum dia alguém vai estar. Temos o sentimento de missão cumprida e de gratidão, mas não é desta forma. Agora, o fato de ter que enterrar um filho é extremamente destrutiva”, frisou.

Muitas vezes, vizinhos, parentes e amigos podem passar pela morte de seus filhos e precisam de apoio neste momento difícil, segundo Daniele. “Se você sabe de alguém que perdeu realmente um filho, esta pessoa não vai pedir ajuda, ela vai ficar no cantinho dela, está contra a vida, Deus, a humanidade e não está bem. É momento de levarmos, aos pouquinhos, levando uma atenção, carinho e afeto para que ela consiga reconstruir a vida dela e lembrar sempre desta pessoa tão importante que era dela e hoje está nos planos do Pai”, observou.

Visão espírita – Marli Traple, presidente da Sociedade Espírita Alan Kardec de Irati, diz que, para os espíritas, a comunicação com os falecidos deve acontecer todos os dias. “Nós, espíritas, acreditamos na imortalidade da alma e também nas ligações fluídicas que são feitas, comunicações através do pensamento. Podemos nos comunicar com as pessoas que amamos e que partiram, através dos sentimentos, de boas vibrações. Sentimos saudades e carinho por aqueles que já se foram, então, através do pensamento, ligamos as nossas mentes numa boa sintonia com aqueles espíritos que já partiram. Respeitamos o dia de Finados, sabemos da importância deste dia para que as pessoas façam suas orações, levem suas flores, algumas levam suas velinhas para acender, e tudo isto é muito bonito e carinhoso. Sabemos que não precisa ser feito isto só neste dia: devemos lembrar dos nossos entes queridos todos os dias”, frisou.

Quer receber notícias pelo WhatsApp?

Tradição judaica e cristã – Os cristãos e os judeus vivem a experiência de enterrar os mortos. Para os judeus, os corpos devem ser enterrados na direção do sol nascente, de onde viria o Messias. Já para os cristãos, o enterro deve ser feito em direção à cruz, contou o Padre Hélio. “Por isto que, nos nossos cemitérios, nos túmulos, temos em um lugar adequado o cruzeiro e os corpos dos nossos irmãos permanecem ali depositados, esperando a ressurreição também da carne, como nós professamos no Creio”, afirmou.

Momento de despedida – À medida que as pessoas deixam de visitar os cemitérios, de fazer memória dos fieis defuntos, elas apresentam mais dificuldades de lidar com a morte. O padre lembra que, atualmente, por questões sanitárias, os velórios devem ser feitos em locais apropriados, como as capelas mortuárias. Porém, no passado, eles aconteciam nas residências dos falecidos.

“Quando crianças, nós lembramos de que maneira participávamos destes velórios. Era o momento de reunião familiar, de fazer memória, de comermos juntos e estarmos com o defunto. Depois, levávamos ao cemitério, participávamos do enterro, fazíamos as orações e tudo aquilo que envolvia esta realidade do luto. Passando o tempo necessário do luto, a família seguia em frente, com as boas memórias, mas com esta confiança na esperança do Senhor”, comentou.

Para o padre, se não houver este momento de despedida e as pessoas deixarem de ir ao cemitério, elas acabarão esquecendo aquele ente querido que faleceu e também que a morte existe. “Aí, então, justamente quando somos surpreendidos por ela relacionado a alguém que é próximo de nós, sofremos em dobro porque estamos desabituados a lidar com a realidade da morte. Então, é muito salutar visitar o cemitério, cuidar dos túmulos dos nossos entes queridos e preservar este lugar de memória não só da vida, mas da esperança na ressurreição e na vida após a morte”, frisou.

Celebrações católicas – Padre Hélio lembra que, no dia de Finados, os católicos realizam a celebração dos fiéis defuntos durante as missas. “Ou seja, nós fazemos memória dos nossos irmãos e irmãs, parentes e amigos falecidos, aqueles que estiveram conosco, caminharam por esta vida e a sua vida não chegou ao fim, mas ao seu momento de passagem para a eternidade. Para nós, que cremos em Jesus Cristo, a morte ganhou um novo sentido: ela, que era tida como o fim de tudo, em Jesus Cristo, ela torna-se apenas uma passagem para a vida eterna. Cremos que, pelo batismo, a nossa vida passa a fazer parte da vida de Cristo. Então, se Cristo ressuscitou, nós também, que fomos batizados por esta grande graça, recebemos a herança da vida eterna, a certeza da ressurreição”, frisou.

O gesto de visitar os cemitérios no dia de Finados traz o significado da ressurreição, segundo Hélio. “Normalmente, nós vamos até lá para levar flores, que significam que esta semente lançada à terra, que é a vida de cada um de nós, já desabrochou para a eternidade, chegou à sua plenitude. Não importa a idade com que esta pessoa morreu, seja um recém-nascido, uma criança, um adolescente, um jovem, um adulto ou pessoa em idade avançada, foi o tempo necessário para a maturação desta semente de amor lançada à terra pelo senhor nosso Deus, que desejou a nossa vida e que, no momento adequado e às vezes até mesmo repentino para nós, mas que Deus transformou, pela sua misericórdia, em momento da graça, esta vida desabrochou para a eternidade”, pontuou.

Este site usa cookies para proporcionar a você a melhor experiência possível. Esses cookies são utilizados para análise e aprimoramento contínuo. Clique em "Entendi e aceito" se concorda com nossos termos.