Movimento pró-leite nacional pede que importação do leite seja interrompida

Produtores dizem que a importação traz prejuízos ao setor. Em entrevista à Najuá, o colaborador…

26 de setembro de 2023 às 20h16m

Produtores dizem que a importação traz prejuízos ao setor. Em entrevista à Najuá, o colaborador do movimento, Gilvane Cipriano, comentou sobre os problemas que a cadeia produtiva está enfrentando/Texto de Karin Franco, com participação na entrevista de Rodrigo Zub e Juarez Oliveira

Gilvane Cipriano é produtor de leite de Rebouças e faz parte do Movimento Pró-Leite Nacional. Foto: João Geraldo Mitz (Magoo)

Os produtores de leite que fazem parte do Movimento Pró-Leite Nacional pedem que seja interrompida a importação do produto no País. Segundo os produtores, a importação tem trazido prejuízo ao setor que já sofre com os preços baixos do leite.

Em entrevista à Najuá, o produtor de leite de Rebouças e colaborador do movimento pró-leite nacional, Gilvane Cipriano, conta que a importação tem dificultado a competividade. “Nós estamos enfrentando uma entrada de leite de importação muito forte e que não ocorria nos últimos anos. Esse leite está prejudicando toda a cadeia nacional de produção”, conta.

O Brasil é o terceiro maior produtor de leite do mundo, com 1 milhão e 200 mil produtores, sendo que 900 mil são agricultores familiares. Apesar da produção alta, o Brasil importou no primeiro semestre 116 mil toneladas de leite e derivados, um aumento de 240% em relação ao mesmo período de 2022. Gilvane conta que o País tem produção suficiente para abastecer o mercado nacional, sendo que é preciso importar apenas 3% de leite de fora. No entanto, a importação chega a 12%.

A importação ocorre porque o preço de fora está mais baixo que dentro do País. A situação agrava um problema antigo relacionada ao preço do leite, onde o custo de produção é maior do que o preço pago para os produtores. “Nós temos um custo de R$ 2 o litro, até R$ 2,35. É um custo variável, mas nós temos os produtores recebendo na nossa região, tem um produtor recebendo a R$ 1,70 litro de leite. Quer dizer que se ele tem o custo mais baixo que é R$ 2, ele está tirando no final do mês, por litro de leite, R$ 0,30 centavos. Ele trabalhou das quatro da manhã às oito horas da noite, desgastou os seus equipamentos, depreciou o equipamento, as vacas ficaram mais velhas, para ele pagar R$ 0,30 centavos ainda por litro de leite que ele produziu no final do mês. Não tem mercado nenhum, não tem emprego nenhum que acontece isso”, explica o produtor.

Outro problema do setor é relacionado aos laticínios. “Os laticínios nos pagam depois que eles receberam todos os 30 dias de leite. Eu entrego 30 dias para o laticínio, o laticínio paga no dia 15 do próximo mês. Só lá eu vou saber quanto que eu vou receber do leite que eu entreguei 30 dias atrás. Qual atividade hoje no Brasil que espera 45 dias depois de entrega do primeiro leite? A tua primeira mercadoria, que vai saber o preço que tu vais receber”, disse Gilvane.

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O tempo para o pagamento é estipulado por lei. Segundo o produtor, os laticínios vendem o produto com um tabelamento baixo. “A lei exige o seguinte: 30 dias antes de eu começar a entregar o leite, ele tem que apresentar o valor mínimo que vai ser pago ao produtor. Se o preço mínimo for R$ 1,50, ele está cumprindo a lei. Só que o valor real que ele paga ao produtor é o R$ 2. Tem uma diferença de 30%, que o laticínio faz como quer. Essa lei está errada. Ele tem que cumprir exatamente o valor que vai ser pago. Essa é uma discussão também, estamos trabalhando para que isso mude porque é injusto o produtor tem que saber o valor real, porque ele não consegue fixar um custo em cima da produção, se ele não sabe o valor que ele vai entregar o leite, que ele vai receber pelo leite entregue”, explica.

O produtor conta que países da América Latina, como Argentina e Uruguai, conseguem vender para o Brasil um produto mais barato porque possui fatores que interferem no preço final. No Uruguai, o solo é fértil, proporcionando menos gasto com o adubo no pasto. Na Argentina, os subsídios baixam o valor do leite. “Semana passada, Argentina aprovou um subsídio de R$ 1,40 por litro de leite ao produtor. É muito subsídio. Esse leite vem competir conosco, que pagamos toda a carga tributária. É muito injusto, por isso que a nossa questão é cortar a importação, para poder ficar justo”, conta.

Há quatro meses, os produtores de leite começaram a se organizar em grupos de WhatsApp para buscar mudanças no setor. O movimento pró-leite nacional já reúne mais de 4 mil produtores de todo o país e é liderado pelo produtor e ex-prefeito de União da Vitória, Pedro Ivo.

O movimento tem buscado articular algumas mudanças com o governo federal. Segundo Gilvane, as associações entraram em contato com o governo, mas houve demora no retorno. “Na Agroleite deste ano, em Castro, foram entregues novos ofícios em mãos, também solicitando uma prorrogação de dívidas, que as coisas já estavam apertando, os produtores já não estavam conseguindo honrar com seus investimentos nas propriedades para o bem-estar animal. Começou a apertar. Nós já solicitamos, além da suspensão dessa importação, também a prorrogação de dívidas. Não fomos atendidos de imediato”, conta.

O retorno do governo federal aconteceu após uma mobilização que reuniu 600 produtores de leite em Brasília/DF. De acordo com o produtor, a deputada federal Ana Paula Leão (PP/MG), que é presidente da Frente Parlamentar em Apoio ao Produtor de Leite, auxiliou na organização. O deputado federal Pedro Lupion (PP/PR) também tem atuado com o movimento. “Ela [deputada Ana Paula Leão] organizou isso e fomos para Brasília, para também dar uma pressão no governo e mostrar essa realidade. Ali começou a ter alguns movimentos positivos, mas muito a longo prazo. O Governo colocou uma taxação extra num leite que é importado fora do Mercosul, que representa hoje do leite importado cerca de 6%. É muito pouco. Ele não é representativo. O grande foco, que é o leite importado do Mercosul, não tem ainda uma ação imediata”, disse Gilvane.

De acordo com o produtor de Rebouças, o governo federal não tem uma ação mais forte por medo de perder o resultado da balança comercial positiva. “O Brasil tem um acordo com Mercosul de tarifa zero de importação. É um acordo comercial. A nossa balança comercial é muito positiva por causa da quantidade de habitantes do País, o nosso consumo é muito maior. Nós temos uma balança comercial positiva e essa é uma das justificativa que o governo nos coloca que ele não quer intervir na importação. Mas o produtor de leite não pode pagar a conta pelo Brasil ter uma balança comercial positiva. Ele não pode ficar com esse déficit”, afirma.

Para Gilvane, há uma competição injusta. “Quando você deixa de utilizar esse produto brasileiro que é o leite que o produtor hoje tem uma boa qualidade, segue as normas sanitárias, que é caro para o produtor cumprir todas as normas sanitárias – começa a importar um leite que está dentro de uma triangulação, vinda da Nova Zelândia e de outros países através do Mercosul, isso é muito injusto. Nós não conseguimos competir”, destaca.

O prejuízo também segue para toda a região que tem uma atuação forte na produção do leite. “Ninguém ganha com leite importado. Produtor não ganha por não estar sendo remunerado. O governo não está ganhando porque não recebe imposto. Não faz circular o dinheiro. O consumidor não está ganhando porque não tem a garantia de uma qualidade. Quando você tem uma crise grande no setor, muitos saem. Quando muitos saem, depois falta o produto, falta leite e tem que importar. Quando tem que importar e está faltando, o nosso fornecedor vai vender para o preço que quiser. Podemos chegar a pagar R$ 12 ou R$ 15 o litro lá para frente o consumidor. Esse benefício ele também não tem. A cadeia toda do leite é ruim e para o consumidor também é muito ruim”, disse.

Produtores de leite interessados em entrar para o movimento podem enviar mensagens para o número 9-9855-6404.

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