Neste Dia de Finados, conheça a rotina e as curiosidades do serviço funerário em Irati, um trabalho marcado por respeito, empatia e dedicação/ reportagem de Diego Gauron

No Dia de Finados, costumamos lembrar de quem já se foi. Mas, por trás de cada despedida, existe um trabalho discreto, silencioso e essencial: o dos agentes funerários. São profissionais que lidam diariamente com a dor e a emoção das famílias, e que têm a missão de transformar um momento de perda em uma despedida digna. Nos bastidores dessa profissão existem as curiosidades e também o lado humano que quase ninguém vê, mas que faz toda a diferença quando a vida chega ao fim.
O agente funerário João Maieski Moureira define sua profissão como uma missão que vai muito além de um serviço técnico. Há 16 anos no ramo, ele lembra que a rotina é intensa e imprevisível. “É uma vida bem agitada. Muitas vezes a gente tem que deixar o almoço pela metade ou até ficar sem almoçar. Tem que se doar muito para as famílias. Muitas vezes é preciso ser ‘meio que psicólogo’, porque a família chega totalmente perdida”, conta.
João atua na Funerária Nossa Senhora da Luz, em Irati, e diz que cada atendimento traz uma responsabilidade única. “É um dos momentos mais difíceis, porque se divide em duas partes: quando você vai retirar o corpo da casa e quando chega à capela. A família está abalada, e todo mundo espera que o corpo fique bonito. A gente tenta fazer o melhor, porque é o último momento em que a família vai ver aquela pessoa.”
O agente explica que o preparo é feito com zelo e delicadeza: “A gente dá banho, arruma, deixa bonito, cheiroso, apresentável. É um cuidado que precisa ser feito com respeito.”
Quando o destino escolhe a profissão
Antes de trabalhar no setor, João exercia uma função bem diferente. “Eu era porteiro da empresa Yazaki, e um colega que trabalhava na funerária me indicou quando abriu uma vaga. Eu falei: ‘trabalhar com morto?’ Eu tinha medo de morto. Mesmo assim, aceitei o desafio”, recorda, rindo.
Ele conta que o primeiro plantão foi tranquilo, até que, às seis da manhã, chegou o chamado para atender um óbito de uma criança de 45 dias. “Parece que foi um anjo que pegou na minha mão. Foi ali que percebi que essa seria minha profissão.” Quinze anos depois, ele voltou a atender a mesma família — dessa vez, o avô daquela criança. “A família me reconheceu. Essas coisas marcam muito a gente. As pessoas ficam na nossa memória.”
Histórias que tocam e transformam
Ao longo dos anos, algumas situações emocionaram mais do que outras. João recorda um atendimento em um final de ano que o marcou profundamente. “Foi um óbito de uma criança grande, forte, que faleceu de forma trágica. Na época, minha esposa estava grávida do nosso primeiro filho, com praticamente a mesma idade daquela criança. Aquilo me marcou muito”, contou, emocionado.
Hoje, ele diz que já não vê o trabalho com o mesmo olhar de quando começou. “No começo, eu vim achando que era uma aventura. Depois vi que era uma profissão de verdade. A gente aprende a lidar com as famílias, a acalmar, a entender o que elas precisam.”
Entre o respeito e a personalização do adeus
A proprietária da Funerária Nossa Senhora da Luz, Samara Coelho, conheceu a profissão de uma maneira bem diferente. Ela cresceu próxima da rotina funerária.
“Antigamente nem tinha um lugar fixo para as funerárias, usava-se o necrotério do hospital. Em alguns casos, o corpo ficava no carro e passava a noite em casa, porque no dia seguinte iria para o IML”, relembra.
Ela explica que o trabalho exige tanto preparo técnico quanto sensibilidade. “A gente tem cuidado tanto com a pessoa falecida quanto com a família. É como se estivesse guardando a pessoa dentro de uma caixinha de joia”, compara.
Para Samara, cada detalhe importa. “Às vezes a família pede para colocar determinado tipo de flor, arruma o cabelo de algum jeito especial ou algum tipo de roupa e a gente faz. O importante é que a família veja a pessoa como ela era, não alguém diferente. Se ela nunca usou terno, por exemplo, por que iria usar no último momento?”, questiona.
Mitos, rotina e serenidade
Sobre o imaginário popular, João diz que nunca viveu nada de “assustador” no ambiente de trabalho. “Isso é tudo misticismo. Nunca ouvi barulhos nem vi nada. As pessoas se benzem quando veem o carro da funerária, acham que é coisa de outro mundo. Mas pra gente é normal, faz parte da rotina.”
Ele esclarece também uma dúvida comum sobre o preparo dos corpos: esse serviço não é realizado nos escritórios centrais das funerárias, mas sim, em laboratórios especializados em outro local de Irati.
João acredita que o tempo transforma o medo em respeito. “No começo, eu tinha receio. Hoje, a gente entende o valor que esse trabalho tem.”
Tradição, profissionalismo e acolhimento
Também com muita experiência no setor, a Funerária Irati também faz parte da história do município. A proprietária Roseli Silva explica que a empresa surgiu para suprir uma necessidade da região. “Na época, o serviço funerário era pouco estruturado. A iniciativa veio para oferecer um atendimento mais digno e profissional às famílias.”
Desde então, o setor evoluiu. Segundo ela, a principal mudança foi a chegada da tanatopraxia, técnica moderna de conservação e restauração. “Isso revolucionou o preparo do corpo, garantindo uma apresentação mais serena e natural, o que é fundamental para o conforto visual das famílias.”
Roseli destaca que o trabalho deixou de ser apenas logístico para se tornar um serviço de acolhimento. “Hoje, o foco é o suporte emocional. Lidar com o luto exige empatia, e nossa equipe é treinada para isso. A família precisa sentir que está sendo cuidada.”
Outro avanço que ela destaca foi a diversificação de serviços, que permitem às famílias se planejarem e reduzirem as preocupações em um momento difícil.
“O nosso diferencial é o acolhimento genuíno e a tradição com profissionalismo. Não somos apenas prestadores de serviço; somos um suporte para a comunidade. Queremos que a família saia da funerária apenas com a tarefa de se despedir, e não com uma pilha de burocracia para resolver”, resume Roseli.
Profissionais com uma missão silenciosa
Entre a correria, o silêncio e as histórias que tocam fundo, os profissionais do setor funerário dividem uma certeza: cada despedida é única.
“É um trabalho que exige respeito e entrega. A gente aprende que, por trás da dor, existe sempre amor — e é isso que nos faz seguir”, resume o agente funerário João Maieski Moureira.
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