Reuniões foram realizadas nesta terça e quarta-feira, 25 e 26, após a disseminação do jogo Baleia Azul, cujo último estágio é o suicídio
Paulo Henrique Sava
Em razão da preocupação levantada com o envolvimento de jovens e adolescentes com o conhecido jogo “Baleia Azul” e sua disseminação entre este público, foi criado um grupo de trabalho que irá promover orientações aos pais e alunos das escolas do município de Irati. O grupo é composto por profissionais da psicologia e da Secretaria de Saúde, além de representantes do Poder Judiciário e de colégios do município. Conselheiros Tutelares de Irati também integram este grupo.
O grupo irá atuar de maneira pontual, orientando os pais a darem mais atenção para seus filhos no dia a dia, evitando desta forma situações que levem os jovens a acabar com a própria vida, seja pelo uso de drogas ou pelo suicídio. Nesta quarta-feira, o grupo esteve reunido na sede da Secretaria Municipal de Saúde. Os atendimentos serão feitas de forma individual para que situações, como as que envolvem o jogo Baleia Azul, não sejam ainda mais disseminadas entre os jovens.
A secretária da Escola Estadual Luiza Rosa Zarpellon, Lúcia Mara, conversou com a nossa reportagem. Para ela, a família deve prestar mais atenção nestas crianças e adolescentes. “A raiz está aí: a família estar mais atenta a seus filhos, acompanhar, amar e estar junto a eles, observando e apoiando naquilo que eles precisam”, frisou.
Segundo Lúcia, família e escola podem trabalhar juntas nestas situações. Porém, ela acredita que os jovens estão vivendo apenas uma “fase que logo vai passar” e que pode ser contornada da melhor fase possível. Lúcia comenta que tem um filho de 24 anos e uma menor de 14 anos. Ela diz que a criação dos filhos exige muito da mãe no dia a dia. “A mãe precisa se privar de estar lavando roupa, limpando a casa, e guardar um tempinho para observar seus filhos, porque eles crescem rápido: daqui a pouco estão fazendo a vida deles, vivendo e passando estas fases, e a gente, se não estiver atento, perde a oportunidade de estar orientando e ajudando”, comentou.
Atendimentos serão pontuais
A psicóloga Daniele Pires Soares explica que a intermediação destes atendimentos não será feita de forma coletiva, como em palestras, por exemplo, mas de forma individual. “A gente não precisa fazer este ‘auê’ todo, não precisa chamar toda uma coletividade para se colocar a situação. Quando perceber algo pontual em alguma criança ou adolescente, ela [escola] irá comunicar aos pais para procurar orientar, investigar o que está acontecendo,e muitas vezes orientar sobre situações que estão ocorrendo em casa, para estar mais próximos da criança, do adolescente, de estar mais presente, sair com ele e convidá-lo para sair. Precisamos convidar, seja uma, duas ou mais vezes: uma hora ele vai ceder, vai estar presente e vai sair e ter este acolhimento”, comentou.
Necessidade de atenção
Para a psicóloga, por mais que o adolescente esteja “fechado em seu mundinho”, ele sente muita falta da atenção materna e paterna. Daniele acredita que atitudes de acolhimento podem fazer a diferença para evitar o uso de drogas, por exemplo. “A gente precisa resgatar os valores que tivemos no passado, na nossa educação, nas nossas casas, nas vivências com nossos avós e com os pais. O pessoal fala que a vida de hoje está moderna, as coisas mudaram, tem muita mudança, muita tecnologia. Eu concordo plenamente, e precisamos nos adaptar a isso, mas sem perder o respeito e estes valores, porque é isto que constrói a nossa vida e os nossos filhos. Percebemos que muitas crianças estão com depressão infantil, e muitos adolescentes nesta situação depressiva. Aí, tudo dissemina para as drogas, suicídio e qualquer outra coisa negativa. Temos que tomar muito cuidado em relação a isso”, frisou.
Auxílio da Secretaria de Saúde
O secretário de saúde, Agostinho Basso, ressaltou que os funcionários da pasta foram orientados a prestar atenção aos sinais demonstrados pelos adolescentes de que podem estar com depressão. No entanto, ele ressalta que a situação não deve ser vista como alarmante ou tão grandiosa. “Nós sabemos que o problema que atinge os adolescentes, as crianças e os jovens é muito mais profundo e mais complexo. Eu vejo que tudo isto está servindo para nos mostrar, enquanto pais, que às vezes os nossos filhos precisam de mais carinho, dedicação e amor”, pontuou.
Para Agostinho, os pais que beijam seus filhos todos os dias saberão identificar quando o comportamento deles está diferente. Na opinião do secretário, eles saberão identificar até mesmo se os filhos usaram drogas ou não. “Os jovens precisam perceber que são amados e que têm importância. Hoje em dia, os jovens estão se sentindo muito desassistidos”, frisou.
Princípios que devem ser resgatados
Agostinho apontou três princípios para os quais os pais precisam estar atentos. O primeiro deles é o religioso. “Eu não estou falando de uma religião, mas da existência de um Deus, seja ele qual for, do jeito que você acredita, mas este Deus, o jovem e o adolescente urgentemente tem que saber que ele existe e se preocupa com ele e que é importante”, comentou. No entanto, segundo Agostinho, a família não pode delegar toda a educação religiosa para a igreja, como acontece na maioria das vezes.
O segundo princípio a ser resgatado é a autoridade dos pais. “A criança e o adolescente têm o direito de serem educados com autoridade paterna e materna. A criança tem este direito, e é dever dos pais: os filhos têm que saber que pai e mãe são autoridades, com os defeitos que ambos têm. Nenhuma família é ideal ou tem pessoas que voam e possuem auréolas, pois somos humanos”, comentou.
Segundo Agostinho, o terceiro princípio é o da cidadania, uma vez que os jovens e adolescentes são o futuro da sociedade. “A sociedade precisa de jovens e adolescentes maduros, preparados para o mundo e principalmente para o ‘não’. Tem crianças que nunca aprenderam o que é o não, e nós vemos isto na Saúde: para tomar uma injeção, às vezes as crianças e adolescentes quebram as cadeiras, viram as mesas. Para tomar um remédio, eles xingam os pais. Como é que uma criança de 03 anos vai dominar um adulto, do jeito que nós vemos nas Unidades de Saúde? Uma criança que decide se vai ou não a um determinado lugar?”, questionou.
Baleia Azul
Para Agostinho, o jogo “Baleia Azul” surgiu apenas para alertar que os filhos estão precisando de atenção e sofrendo no “mar da indiferença dos pais”. “Nossos filhos estão à deriva, procurando uma tábua de salvação. Quando o navio afunda, ele resulta em destroços que boiam, e a pessoa se agarra ali. Precisou vir uma Baleia Azul para mostrar a todos que os nossos filhos precisam que os pais deem menos presentes e mais presença”, comentou.
O secretário ressalta que a atenção e o carinho dos pais pode refletir nas ocorrências de suicídio e na saúde dos jovens. “O suicídio é o último grito de uma pessoa: ‘viu como era sério?’, ‘viu como eu estava precisando?’, ‘viu como ninguém me ouviu?’. Para um jovem, que tem tudo pela vida, cometer o suicídio por causa de um jogo é sinal de que a sociedade precisa estar alerta e repensar valores religiosos, familiares e de cidadania”, finalizou.
Caso os pais percebam algo diferente no comportamento dos filhos, primeiro eles devem procurar conversar com a criança ou adolescente, e depois procurar atendimento psicológico no sistema público de saúde o mais rápido possível.