Delegados da região e OAB falam sobre projeto de descriminalização do porte de maconha para consumo

Ministro Dias Toffoli pediu vistas do projeto e paralisação a votação por 90 dias. Placar…

15 de abril de 2024 às 18h10m

Ministro Dias Toffoli pediu vistas do projeto e paralisação a votação por 90 dias. Placar está em 5 a 3 a favor do projeto/Paulo Sava

Delegados da região e presidente da subseção da OAB de Irati falaram sobre projeto que visa descriminalizar o porte de maconha para consumo. Fotos: Paulo Sava, Arquivo Najuá e e Reprodução Facebook

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou em março a discussão sobre o projeto de descriminalização do porte de maconha para consumo no Brasil. O placar, até agora, está em 5 a 3 a favor do projeto. Porém, um pedido de vista do ministro Dias Toffoli paralisou a votação por até 90 dias. Ainda não há data para que ela seja retomada.

Nossa reportagem procurou os delegados da região para saber como é o procedimento em casos de abordagem de pessoas com maconha. O delegado Mikail Moss Horodecki, de Imbituva, destacou que a Lei nº 11.343, que regulamentou as penas do tráfico e do porte de drogas para consumo pessoal, prevê penalidades como advertência, prestação de serviços à comunidade e comparecimento a curso educativo, no caso do usuário de entorpecentes. Já para os traficantes, as penas são mais altas, podendo chegar a até 15 anos de prisão.

Mikail Moss Horodecki, delegado de Imbituva. Foto: Paulo Sava

Não existe uma quantidade mínima de entorpecente para se caracterizar o tráfico de drogas, de acordo com o delegado. “A quantidade de drogas é só um dos parâmetros que devem ser avaliados pela autoridade policial, pelo PM na rua e pelo juiz na hora de aplicar a sanção. Ou seja, um traficante pode estar vendendo uma quantidade ínfima de 5 gramas de maconha, mas se for flagrado vendendo, vai caracterizar o tráfico de drogas. Em contrapartida, a pessoa pode estar com 50 gramas de maconha e ser enquadrada como usuária, com uma pena bem mais leve”, frisou.

Há uma divergência entre os próprios ministros em relação à quantidade de maconha que caracterizaria a pessoa como usuária. Os delegados avaliam que, na prática, esta seria uma cota para o traficante fazer até um “delivery” de entorpecentes. Outros fatores podem caracterizar o portador de droga como traficante, segundo o delegado de Teixeira Soares, Wesley Vinícius Gonçalves da Silva.

“Elementos como uma grande quantia em dinheiro, ele pode ter acabado de vender as drogas e está apenas com um resquício. Há elementos de denúncia de que ele está traficando, como a localidade e a pessoa com quem está tratando. Se um traficante for pego entregando uma pequena quantidade de drogas a outra pessoa, ele vai ser sim indiciado por tráfico de drogas, não importa a quantidade”, pontuou.

Invasão de competências – Na visão de Mikail, o julgamento do STF é uma invasão de competências do Poder Legislativo. “A meu ver, este julgamento do STF é uma invasão de competências do Poder Legislativo e, na prática, vai liberar o uso de maconha. De repente, o pai vai levar o seu filho para o colégio e vai encontrar um usuário fumando maconha na porta. Efetivamente, se isto for declarado inconstitucional, é o que vai acontecer, dentre outras diversas hipóteses”, comentou.

Cultivo de maconha – Além da cota para porte de drogas, o STF também julga a possibilidade de a pessoa cultivar ou possuir até seis pés de maconha e não ser considerada traficante. Para Mikail, isso vai contra os objetivos da Constituição Federal, que proíbe o comércio de entorpecentes. Ele contou qual é a sanção para o proprietário onde pés de maconha são encontrados.

“Digamos que, numa fazenda, haja uma plantação de pés de maconha, a propriedade inteira é confiscada. Além do proprietário ser apenado, ele perde a propriedade justamente para impedir totalmente o plantio deste tipo de produto”, comentou.

Na opinião de Mikail, um aumento da pena para o usuário poderia impedir que ele utilize drogas e financie o crime organizado. “Quem está financiando, no final das contas, é o usuário”, ressaltou.

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Wesley Vinícius Gonçalves da Silva, delegado de Teixeira Soares. Foto: Paulo Sava

O delegado Wesley destacou que o porte de drogas para consumo pessoal é considerado crime pela legislação. “Caso o usuário seja abordado pela Polícia Militar e esteja portando a droga, ele vai ser conduzido até a Delegacia de Polícia, onde será ouvido e vai responder a um procedimento, chamado de Termo Circunstanciado de Ocorrência por aquela posse. A droga vai ser apreendida e encaminhada para a perícia. Caso ele esteja com uma quantidade maior ou elementos indiquem que está realizando tráfico de drogas, ele vai ser preso e responsabilizado”, frisou.

Para o delegado de Teixeira Soares, cabe aos setores da segurança pública combater o uso e o tráfico de entorpecentes. “O usuário não prejudica só a sociedade, mas também a si mesmo, a seus familiares e a toda a população. Como forma de demonstrar os malefícios que o tráfico de drogas traz para a cidade, costumamos dizer que ele gera inúmeros outros crimes. Ele pode gerar furtos, pois o usuário vai ter que furtar para manter seu vício. Pode também gerar ameaças, pois o traficante de drogas vai ameaçar o usuário caso ele não pague pela droga. Além disso, podem ocorrer homicídios, porque, como é uma atividade ilegal, caso o usuário não faça o pagamento das dívidas que tem com o traficante, a forma que ele tem de intimidar o usuário é mandando que o executem, cometendo homicídios”, comentou.

Furtos – Wesley diz que para o manter o vício, os usuários de drogas costumam realizar furtos para obter dinheiro e comprar os entorpecentes. “Nós já tivemos casos de indivíduos roubando para conseguir dinheiro e financiar o tráfico de drogas”, comentou.

Thiago França Nunes, delegado de Rebouças. Foto: Paulo Sava

Poder Legislativo – O Delegado de Rebouças, Thiago França Nunes, ressalta que a Constituição prevê que mudanças na legislação devem ser sugeridas pelo Poder Legislativo. “Portanto, caberia ao Congresso decidir, como representantes do povo, eleitos, sobre criminalizar ou descriminalizar condutas. Por isso temos leis, e temos a 11.343/2006, que criminaliza o porte de drogas em seu artigo 28. O STF começa agora, com base em princípios, a entender que ele deve decidir, por meio de votação, ou seja, não é uma lei, dar uma interpretação descriminalizando. Isto é muito perigoso porque existe um certo ativismo judicial, já criticado há alguns anos. Os tribunais e juízes acabam adentrando em todo e qualquer assunto, alterando o equilíbrio entre os poderes”, comentou.

O que está sendo votado – O presidente da subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR) de Irati, Mário Cézar Pianaro Ângelo (Marinho), conta que o STF está julgando um recurso da Defensoria Pública do Estado de São Paulo por conta de uma pessoa presa com três gramas de maconha, que foi acusada de tráfico. O advogado detalhou como funciona a legislação.

Mário Cézar Pianaro Ângelo (Marinho), presidente da subseção da OAB de Irati. Foto: Reprodução Facebook

“Se for caracterizado que a pessoa flagrada com substância entorpecente é usuária, ela está sujeita a uma pena de advertência, admoestação verbal, o que, resulta, na prática, em uma audiência com o juiz da vara criminal, que vai orientar esta pessoa sobre os malefícios do uso de entorpecentes, mas não vai gerar uma condenação criminal. O grande problema que o STF está debatendo e tentando encontrar uma solução é que não há, na lei, um critério para se estabelecer quem é usuário e a partir de que momento já se caracteriza um traficante”, comentou.

Votação no Senado – Já o Senado está discutindo uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que apresenta um mandado de criminalização do porte de drogas, impedindo que o STF continue com o julgamento para tornar o porte de drogas constitucional.

O delegado de Rebouças afirma que, neste caso, o que está ocorrendo é uma reação legislativa. “Quando o STF vai decidir sobre algum assunto que desagrada a população, os políticos reagem tramitando uma PEC para deixar mais difícil de o STF adentrar naquela situação, naquele mérito. Está tramitando uma PEC que busca evitar a descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal”, apontou.

Sobre este assunto, Marinho afirmou que se trata de uma questão polêmica por conta das prisões em massa que isso poderia causar.

“É uma questão de política criminal porque um dos argumentos que está sendo levado em consideração é o encarceramento em massa, que já existe e pode aumentar, dado a esta PEC. Aqueles que são contrários argumentam que isto vai acabar carregando mais o sistema prisional e oferecendo mais mão-de-obra para as facções criminosas. Por outro lado, os argumentos a favor da PEC dizem que não tem lógica o produto, enquanto está nas mãos do traficante, ser um crime grave, e quando chega às mãos do consumidor não ser mais de responsabilização criminal”, comentou.

Eduardo Mady Barbosa, delegado aposentado. Foto: Arquivo Najuá

Outras drogas – O delegado aposentado Eduardo Mady Barbosa, aponta que não são apenas as drogas que geram outros problemas sociais. Ele também citou o consumo de bebidas como um fator prejudicial.
“Este tipo de discussão tem que partir de um raciocínio, de uma argumentação lógica, concreta. Se você pegar os municípios pequenos, a maior parte dos problemas com drogas está relacionada ao álcool e não à maconha. Você tem embriaguez ao volante, lesões corporais, brigas e agressões a nível de bares e botecos, além de restaurantes e festas. Temos vários crimes praticados sob a égide da Lei Maria da Penha que envolvem o álcool”, frisou.

Eduardo questiona o fato de a sociedade se negar a discutir a descriminalização da maconha e continuar vendendo bebidas alcoólicas, que também causam malefícios para as pessoas.

“Que sociedade é essa que se nega a discutir a descriminalização da maconha, que é uma droga, e vende outra? O álcool é uma droga porque causa dependência, mas é vendido no supermercado, no posto de combustível, lojas de conveniências, bares, festas, restaurantes. Eu participei de uma formatura onde o pessoal levava bebida: whisky, vodka, cerveja de tudo quanto é nível, e a sociedade aceita. O começo desta discussão tem que ser racional, as pessoas têm que ver os fatos e os dados estatísticos”, pontuou.

Serviço – Denúncias sobre tráfico de drogas podem ser feitas de forma anônima pelo telefone 197 (Polícia Civil) ou 190 (Polícia Militar)

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