4ª Regional de Saúde defende descentralização do pré-natal: “mudança de cultura”

Segundo diretor Eugênio Mazepa, um pré-natal de qualidade envolve mais que diagnóstico e tratamento e…

13 de setembro de 2024 às 13h15m

Segundo diretor Eugênio Mazepa, um pré-natal de qualidade envolve mais que diagnóstico e tratamento e inclui acolhimento à gestante e ao pai da criança, entre outros fatores/Texto de Edilson Kernicki

Em nota encaminhada à Najuá, a 4ª Regional de Saúde defendeu a descentralização do tratamento pré-natal. A afirmação foi feita após o obstetra Luiz Angelo Fornazari, que atua na Santa Casa de Irati, apontar fatores que podem estar ligados à falta de esclarecimento dos critérios de definição sobre tipo de parto, cesariana e normal, desde que a antiga Lei do Parto Adequado ou Cesárea a Pedido (antiga Lei 20.127/2020) entrou em vigor. A polêmica surgiu com a revogação do artigo 111, inciso VII, parágrafos 1º a 4º da Lei Estadual 21.926/2024 – o Código Estadual da Mulher Paranaense (CEMP). O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJ/PR) revogou em 17 de junho de 2024 o artigo da Lei aprovada pela Assembleia Legislativa (ALEP) em 11 de março, que versa sobre o direito de a gestante optar pela realização de cesariana na modalidade eletiva.

De um lado, Fornazari alega que o pré-natal descentralizado, com médicos com alta demanda e atenção dividida com outros tipos de pacientes, deixa de orientar adequadamente a gestante sobre o parto. Assim, elas recorrem às redes sociais para se informar e muitas influencers que abordam a própria experiência com a maternidade em seus perfis acabam gerando nas suas seguidoras o medo do parto normal.

Na nota assinada pelo diretor da 4ª Regional, Eugenio Mazepa defende a necessidade de “mudança de cultura”. “A assistência não pode ser centrada num único profissional, pois um pré-natal de qualidade engloba mais que diagnóstico e tratamento, mas acolhimento da gestante, conhecimento, habilidades adquiridas e uma documentação profissional bem preenchida”, sustenta.

O médico ressalta que a gestante que faz o pré-natal nas Unidades Básicas de Saúde recebe assistência multiprofissional. Além disso, informa que o pré-natal descentralizado é uma premissa do Ministério da Saúde (MS), que tem a Atenção Primária à Saúde (APS) como ordenadora do cuidado, no atendimento tanto da gestante quanto do recém-nascido. O pai do bebê também é incluído nesse pré-natal, ao acompanhar exames e receber orientações para dar todo o suporte necessário à mãe.

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Segundo o diretor da 4ª Regional, a Linha de Cuidado Materno Infantil (LCMI) compõe a Rede de Atenção à Saúde (RAS) no Paraná e se define como um conjunto de ações para garantir a melhor gestão e assistência à gravidez, ao parto e ao puerpério, assim como na saúde e desenvolvimento de bebês até os dois anos de vida.

A LCMI possui como principal instrumento normativo a Linha Guia de Atenção Materno-Infantil (2022), que orienta a organização de ações e serviços de saúde, ao instituir diretrizes de cuidado integral nos três níveis de Atenção: primária (básica); secundária (média complexidade/ambulatorial) e terciária (alta complexidade/especializada hospitalar). Essa Linha Guia “foi construída de forma ascendente e participativa, em consonância com o Planejamento Regional Integrado (PRI) e Plano Estadual de Saúde – PES (2024-2027)”, explica a 4ª Regional.

Um dos princípios da LCMI é a Estratificação do Risco de Gestação, feita a cada consulta, com base em dados pessoais, socioeconômicos, clínicos e obstétricos da gestante. Segundo o diretor da 4ª Regional, essa estratégia identifica fatores de risco para que gestantes, puérperas e neonatos (recém-nascidos) estejam no local certo, no tempo adequado, sendo atendidos pela equipe mais preparada, com acompanhamento contínuo da Atenção Primária à Saúde (APS), o que rebate a crítica de Fornazari à descentralização.

Conforme a 4ª Regional, é a Estratificação de Risco da Gestação que define onde será feito o pré-natal: na Atenção Primária são atendidas as gestantes de risco habitual e, de forma compartilhada com a Atenção Ambulatorial Especializada (AAE), as de risco intermediário e alto risco. Em todas as consultas, as informações são registradas na Carteira da Gestante, instrumento usada desde a gestação até o pós-parto. Nela, a própria gestante e a equipe de saúde anotam informações pessoais e de saúde que subsidiam a continuidade da assistência, em todos os pontos de atenção. “No Paraná, ela foi construída e está disponibilizada pela SESA (Secretaria de Estado da Saúde) de forma personalizada, pois comunica diretamente com os preceitos da RAS (Rede de Atenção à Saúde) e da Linha Guia Materno-Infantil”, acrescenta.

Na Carteira da Gestante está contido o Plano de Parto, que deve ser usado desde a Atenção Primária à Saúde, em uma relação contínua com a Atenção Hospitalar. De acordo com o diretor da 4ª Regional, esse instrumento busca uma experiência segura e positiva de parto e nascimento, algo que não deve iniciar apenas no momento do parto.

O entendimento da 4ª Regional de Saúde é o de que a assistência de qualidade à gestante vai além da consulta e acompanhamento obstétrico. “A gestante é atendida por equipe multiprofissional e, quando necessário, após estratificação do seu risco gestacional, encaminhada para Atenção Ambulatorial Especializada (AAE) no Ambulatório do Modelo de Atenção às Condições Crônicas, no CIS/AMCESPAR (Consórcio Intermunicipal de Saúde), composto por equipe multiprofissional especializada”, explica o diretor.

Cesáreas: Em 2014, o Ministério da Saúde e a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) criaram normas para reduzir a taxa de cesarianas na rede privada, que chegava a 84% dos procedimentos. Com isso, o Ministério da Saúde buscava reduzir a incidência das cesarianas consideradas desnecessárias. Mazepa aponta que o número de cesáreas em rede privada, historicamente, sempre foi superior ao da rede SUS.

“A Lei Estadual nº 20.127/2020, que ficou conhecida como a Lei da Cesárea (recentemente considerada inconstitucional), acarretou um acréscimo no número de cesáreas em gestantes estratificadas como risco habitual, mas isso não se deve apenas por falta de orientação no pré-natal, mas por multifatores, dentre eles os culturais, de modelo de assistência e condutas profissionais”, argumenta.

Redução da mortalidade: A descentralização do pré-natal é premissa da Linha Guia de 2022, que preconiza que a gestante seja atendida de forma compartilhada por toda a equipe da Rede de Atenção à Saúde (RAS), com consultas feitas pelo médico e pelo enfermeiro. Ambos são habilitados por seus respectivos conselhos de classe para essa atividade.

“Na região, a maior parte dos municípios possui, há muitos anos, o pré-natal descentralizado, sendo esse um fator determinante na redução da mortalidade”, enfatiza o diretor da 4ª Regional. Os demais municípios, ainda segundo ele, são constantemente motivados a capacitar seus profissionais, organizar a linha de cuidado local, estabelecer fluxos de encaminhamento e monitoramento, para garantir a assistência com a expertise (perícia) dos profissionais que compõe a Linha de Cuidado Materno-Infantil.

Na nota, a 4ª Regional de Saúde salienta que, na Atenção Primária à Saúde (APS), a qualificação de profissionais e de seus processos de trabalho na assistência ao pré-natal são orientados pelo PlanificaSUS. Com base nessa metodologia de Planificação da Atenção à Saúde (PAS), a equipe técnica de gestão da LCMI estabelece protocolos de assistência e acesso e capacita as equipes de saúde do Estado.
Esses profissionais recebem qualificação através do curso de pré-natal para a Atenção Primária; também pela Terça Tece Linha, que são aulas remotas de temas livres, transmitidas pelo canal do YouTube da Escola de Saúde Pública do Paraná (ESPP) e, ainda, pelo apoio técnico contínuo e pelo provimento de incentivos financeiros próprios do Estado, insumos e equipamentos voltados a este nível de atenção.

“Uma ação estratégica importante para a qualificação do cuidado obstétrico é a formação do Enfermeiro Obstetra. Neste sentido, a região de Irati foi contemplada para o curso de especialização em Enfermagem Obstétrica, iniciado em 2024, voltado a profissionais da LCMI que desejam se aperfeiçoar, coordenado pela ESPP, em conjunto com as equipes técnicas da SESA, da Associação Brasileira de Obstetrizes e Enfermeiros Obstetras do Paraná (ABENFO-PR) e da Associação Brasileira de Enfermagem do Paraná (Aben-PR)”, destaca o chefe da 4ª Regional de Saúde.

Atenção Especializada: Já no que diz respeito à Atenção Ambulatorial Especializada (AAE), a principal estratégia de aprimoramento de equipes, ações e carteira de serviços ofertada às gestantes e bebês de risco intermediário e alto risco é a Qualificação dos Consórcios Intermunicipais de Saúde (QUALICIS), mesmo que a AAE também ocorra nos ambulatórios municipais especializados e hospitalares, de acordo com Mazepa.

É atribuição do QUALICIS as ações de assistência baseadas no Modelo de Atenção às Condições Crônicas (AAE) e o matriciamento das equipes da APS, para garantia de continuidade do cuidado em todas as RAS. O matriciamento é uma estratégia de trabalho em rede, que preza pela integralidade dos serviços de saúde. Ou seja, é um modo de organizar e ampliar a oferta de ações em saúde, que lança mão de saberes e práticas especializadas, sem que o usuário deixe de ser cliente da equipe de referência, conforme o Ministério da Saúde.

Custeio de partos feitos pelo SUS: “Na Atenção Hospitalar, o Programa de Apoio e Qualificação de Hospitais Públicos e Filantrópicos do Sistema Único de Saúde do Paraná (HOSPSUS) e respectivos editais parametriza as tipologias dos serviços e respectivas composições de equipe, assim como aparato tecnológico e estrutural para assistência, de acordo com a estratificação do risco”, explica o diretor da 4ª Regional de Saúde.

Segundo a 4ª Regional de Saúde, o monitoramento do HOSPSUS assegura garantias previstas pela Linha de Cuidado Materno-Infantil: o acesso conforme estrato de risco; a assistência ao parto, respeitados os preceitos de boas práticas; assistência ao recém-nascido baseada em evidências; realização de todos os exames de triagem neonatal e implantação de ações voltadas à segurança do paciente.

Ainda de acordo com o diretor da 4ª Regional, o HOSPSUS incrementou em 100% o custeio de partos por meio da Estratégia de Qualificação do Parto (EQP). O repasse para parto de risco habitual subiu de R$ 200 para R$ 400 por parto. Nos procedimentos de risco intermediário, o repasse para cada parto subiu de R$ 320 para R$ 640.

No caso de partos de alto risco, os recursos para cada hospital foram ampliados de R$ 100 mil mensais para R$ 130 mil – 30% a mais. A Santa Casa de Irati, como parte da Linha de Cuidado Materno-Infantil, se inclui entre os pontos de atenção hospitalar e recebe recursos destinados às maternidades de alto risco (R$ 130 mil por mês), mais os valores recebidos pelos partos de risco habitual e intermediário, que são pagos por procedimento e faturados via tabela SUS. Os valores da tabela SUS podem ser consultados no http://sigtap.datasus.gov.br/tabela-unificada/app/sec/inicio.jsp. A Santa Casa de Irati recebe, ainda, incentivos financeiros do Estado do Paraná ligados às outras habilitações concernentes do hospital, ressalta Mazepa.

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