Por que esquecemos o que aprendemos?

Professor Plínio Marco de Toni, do Departamento de Psicologia da Unicentro, diz que é mito…

14 de setembro de 2024 às 18h07m

Professor Plínio Marco de Toni, do Departamento de Psicologia da Unicentro, diz que é mito acreditar que falta de motivação e atenção pode ser um dos motivos para deficiência na aprendizagem/Paulo Sava

Professor Doutor Plínio Marco de Toni, do Departamento de Psicologia da Unicentro, durante palestra ministrada a estudantes dos aulões da Unicentro, que estão acontecendo no Colégio Estadual Cívico-Militar Duque de Caxias. Foto: Comunicação Unicentro

Em um mundo onde o conhecimento e a informação são mais acessíveis do que nunca, o fenômeno do esquecimento continua a ser um enigma que desafia tanto especialistas quanto leigos.
Em entrevista à Najuá, o professor doutor Plínio Marco de Toni, do Departamento de Psicologia da Unicentro, contou que existem alguns mitos relacionados ao aprendizado, nos quais praticamente toda a população acredita.

O primeiro deles é acreditar que a falta de motivação e atenção pode ser um dos motivos para a deficiência na aprendizagem, o que, segundo Plínio, é um mito. “Isto é um mito porque a atenção é necessária para o aprendizado, mas é só o primeiro fator. Tem uma série de outras coisas que precisamos fazer para de fato aprendermos, e que normalmente não fazemos. Ficamos com a impressão de que estamos aprendendo e caímos nisso. Lemos um texto ou vemos um vídeo, quantas vezes vemos vídeos no YouTube, estamos prestando atenção, tendo interesse em aprender aquele conteúdo, em pouco tempo esquecemos e de repente vemos o vídeo de novo. Isto acontece por não entendermos como o nosso cérebro atende, e isto é fundamental”, pontuou.

Para o professor, a prática frequente de qualquer atividade é essencial para o aprendizado. “Nós ficamos muito bons no que fazemos muito, a prática é fundamental. É claro que vamos melhorando à medida em que vamos treinando, a prática nos faz melhorar, obviamente, e isto todo mundo sabe. A questão é a seguinte: se o seu objetivo, quando você tenta aprender alguma coisa, é lembrar daquele conteúdo daqui a muito tempo, você só vai conseguir fazer isto se praticar lembrar”, frisou.

Métodos tradicionais funcionam? – O problema principal de métodos de ensino tradicionais é que eles são muito “passivos” e não dão o resultado esperado para o aprendizado, na visão de Plínio. “Por exemplo, como funciona normalmente uma aula ou mesmo quando a pessoa está tentando estudar alguma coisa por conta? Ela assiste o professor falando e fica ali, passivamente. Quando você lê um texto, o faz passivamente. O problema é que, como você nunca treinou lembrar, praticar lembrar do conteúdo por conta, sem vídeo, sem texto, sem aula, quando tiver que fazer isto, você não vai conseguir”, pontuou.

De acordo com Plínio, a memória humana necessita de pistas para lembrar de algumas situações.
“Imagina que você conhece tanta gente aqui na cidade. Eu tenho certeza de que, de vez em quando, você encontra alguém que sabe quem é, mas não consegue reconhecer. Isto acontece porque esta pessoa, como você não viu tanto assim, quando você vê na rua, de repente não reconhece. Isto acontece comigo de vez em quando, especialmente em relação aos meus alunos do 1º ano, que acabei de conhecer. A minha memória depende de uma pista: eu reconheço algum aluno novo quando ele está em sala de aula, ou às vezes até sentando no lugar dele; se ele mudar de lugar, eu já não o reconheço. É claro que, com o tempo, vou aprendendo e começo a reconhecer. O aprendizado acontece assim, no geral”, frisou.

O que é preciso fazer para aprender? – Durante a entrevista, o professor contou o que a pessoa precisa fazer para aprender de fato. “Você tem que se livrar do texto, do vídeo e da aula, no sentido de que começa com eles para ter uma base, mas precisa tornar este conteúdo seu, se apropriar dele. Como é que faz isto? Tem que treinar lembrar, sem o texto”, comentou.

O professor afirma que a única oportunidade que o estudante tem de lembrar os conteúdos aprendidos é no momento em que vai realizar uma prova. “Qual é a única oportunidade para o aluno lembrar daquele conteúdo? É a prova. Nesta hora, o aluno se desafia a lembrar sem olhar para o texto, mas é muito pouco., você só fica bom no que fizer muito”, pontuou.

Lembrar sem utilizar materiais – O texto, o vídeo e a aula são fontes importantes para que a pessoa possa ter acesso ao conhecimento. Porém, ela precisa treinar seu aprendizado todos os dias, sem consultar estes materiais. “Assim, vamos construindo mais pistas. Imagine assim: se eu vejo um aluno ou uma pessoa sempre naquele lugar, você vai associá-lo com a pessoa. Se ela estiver fora do lugar, você não a reconhece. Com o conteúdo é assim também”, frisou Plínio.

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Plínio Marco de Toni, professor do Departamento de Psicologia do campus Irati da Unicentro. Foto: Arquivo pessoal

Atenção – A atenção é uma característica biológica do ser humano, observada também em bebês. A capacidade de prestar atenção varia muito entre as pessoas. Entretanto, Plínio destaca que as pessoas aprendem a ficar atentas aos conteúdos ensinados.

“Ela é aprendida, nós aprendemos a prestar atenção. Se você pegar uma criança no início da escola, ela senta ali, aí a professora diz que vai explicar uma coisa e pede que ela preste atenção. Quanto tempo vai durar a atenção dela? Uma criança de quatro ou cinco anos? Um minuto, e olhe lá ainda. A professora, sabiamente, diz para ela voltar amanhã que vão fazer a mesma coisa, ou seja, vai treinando a atenção da criança e chega a uma altura que você consegue prestar atenção por muito tempo, isto é treinável”, frisou.

Vídeos curtos – Na visão do professor, as pessoas estão treinando a atenção para assistirem a vídeos cada vez mais curtos, em todas as plataformas disponíveis. “São vídeos cada vez mais curtos, no TikTok, e mesmo no YouTube. É claro que você está treinando sua atenção para durar 30 segundos, um minuto, e às vezes não consegue nem chegar ao fim do vídeo. Você vai mudando de vídeo no TikTok ou no Instagram, e não tem nem paciência mais para chegar ao fim do vídeo, e isto é aprendido. Não é à toa que um monte de gente tem “déficit de atenção”. Tem uma base biológica, tem gente que tem uma dificuldade muito grande, mas são poucas pessoas, a maior parte é treinável”, comentou.

Pesquisas apontam que, em uma aula tradicional, quem mais aprende é o professor. “Basicamente, o que o professor está fazendo ali enquanto está dando aula? Ele está se lembrando do que aprendeu, e cada vez que se lembra, reforça a memória que ele tem. Você nunca vai ver um professor que esquece o conteúdo que ensina, isto não existe. Imagina se você consegue aplicar isto com os alunos, eles deveriam ser ‘professores’, no sentido de que eles deveriam falar em voz alta aquilo que estão aprendendo, deveriam escrever sem o livro, sem o caderno. Você chega nisso com o passo a passo, e não vai pegar uma criança ou adolescente e até mesmo na universidade e obrigar a falar. Isto gera ansiedade, mas passo a passo e com estratégia, você chega lá. Passivamente, ninguém consegue aprender nada”, comentou.

Fazer anotações ajuda no aprendizado? – Para Plínio, fazer anotações durante a aula on-line ou em sala de aula não ajuda na hora do aprendizado. “Por exemplo, basicamente as pesquisas são assim: você pega dois grupos de alunos, que vão participar da mesma aula: metade precisa escrever, tomar nota, e a outra metade não faz absolutamente nada, só presta atenção. Na sequência, você avalia o quanto eles aprenderam. Não tem diferença nenhuma, e se você avaliar no outro dia, os que não estavam tomando nota e estavam somente prestando atenção lembram mais. O que acontece é que, cada vez que você escreve, precisa prestar atenção no que está escrevendo. Se você estiver prestando atenção no que está escrevendo, é claro que não vai prestar atenção no professor, e perde ele por alguns segundos. Na prática, talvez isto não tenha muito efeito, mas não conseguimos dividir a atenção em duas coisas, mas somente consegue prestar atenção de fato em uma coisa de cada vez”, frisou.

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