Acidente ocorreu no dia 14 de março no trecho da rodovia entre Imbituva e Irati. Vítima estava viajando para ver a filha, que havia nascido um dia antes do acidente. Investigações da Polícia Civil apontam que suspeito dirigia embriagado/Paulo Henrique Sava

A Polícia Civil indiciou um médico por homicídio com dolo eventual após um acidente registrado na BR 153, na tarde do dia 14 de março, que matou Patrick de Camargo Dutra, de 25 anos. Ele conduzia um veículo Gol e seguia no sentido Imbituva-Irati. No momento da colisão, o jovem estava parado no local por conta de obras de recuperação do pavimento da rodovia. O carro dele foi atingido por um veículo Volvo e foi parar embaixo de um caminhão, que estava à frente. Patrick viajava para Irati para se encontrar com a filha recém-nascida e a esposa Liliana, que estavam na Santa Casa. O jovem morreu no local do acidente.
Em entrevista coletiva na manhã de ontem, 13, o delegado de Imbituva, Thiago Andrade, que está conduzindo as investigações, confirmou o indiciamento do médico por homicídio com dolo eventual, ou seja, mesmo sem intenção, ele teria assumido o risco de matar.
““Neste caso, então, a Polícia concluiu as investigações e resolveu, ao final, indiciar o suspeito, motorista do veículo que causou a colisão e a morte da vítima por homicídio doloso, uma vez que todas as circunstâncias apontam que ele não agiu de forma imprudente ou negligente, mas sim com dolo eventual. O dolo no Brasil é dividido em duas partes: o dolo direto, quando se quer a morte, e o eventual, quando ele assume o risco de produzir o resultado. Neste caso, todas as circunstâncias apontam que o médico que estava conduzindo um veículo automotor assumiu o risco de produzir o resultado da morte de alguém, e infelizmente foi o que aconteceu”, frisou.
O médico Fábio Ruperto Cândido Seyboth foi preso e prestou depoimento ao Delegado de plantão no mesmo dia do acidente. Entretanto, ele foi solto no dia seguinte, após pagar uma fiança de R$ 260 mil e está respondendo ao processo em liberdade. A advogada Cristiane Stadler Stecinski, que também cuida do caso e faz parte da acusação, explicou que a fiança foi aplicada porque, inicialmente, o caso estava sendo tratado como homicídio culposo, ou seja, sem intenção de matar.
“No dia dos fatos, primeiramente a Polícia Rodoviária Federal fez uma abordagem primeiramente por homicídio culposo. Aí cabe uma aplicação de fiança. Neste caso, foi aplicada uma fiança alta e foi recolhido este valor pelo médico, que logo em seguida foi liberado”, frisou.
Em depoimento ao delegado de plantão no dia do acidente, o médico disse que não faria o teste do bafômetro porque anteriormente havia feito um exame de sangue na Santa Casa de Irati. Entretanto, em resposta a um ofício encaminhado pela Polícia Civil, o hospital negou que o médico tivesse sido examinado, segundo o Delegado Thiago. “Ele inclusive mostrou o braço dizendo que havia feito o exame de sangue, certamente tentando se excusar de responsabilidade penal maior. Eu oficiei ao hospital e, para minha surpresa, o hospital informou que ele se negou a fazer qualquer tipo de exame lá. Então, ele mentiu para a Polícia também”, frisou.
Com base no depoimento da equipe médica, da enfermeira que prestou atendimento e da Polícia Rodoviária Federal, a Polícia Civil confirmou que o suspeito tinha sinais de embriaguez. O delegado contou o que disseram as testemunhas.
““Ele estava sob efeito de bebida alcoólica, isto é um fato, porque três partes diferentes afirmam isto. Nós temos a equipe médica que o atendeu no dia do acidente e o levou até a Santa Casa, a enfermeira que o atendeu no hospital no dia dos fatos e a Policia Rodoviária Federal (PRF), que falam que ele estava com sinais de embriaguez: forte odor etílico, fala arrastada e até dificuldade para andar. Este primeiro ponto está elucidado para a Polícia”, frisou.
O médico é concursado pela Prefeitura de Imbituva e vinha atuando na Estratégia de Saúde da Família Eloir Chaves. A secretária de saúde do município, Gessana de Antoni Bueno Ribeiro, informou à nossa reportagem que o profissional está afastado de suas funções por conta de um atestado médico.
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Uma testemunha afirmou à Polícia Civil que era comum o suspeito consumir bebida alcoólica após o horário de trabalho, conforme relato do Delegado. ““Em outro momento, uma testemunha afirma que era comum ele sair do trabalho e fazer uso de bebida alcoólica. Inclusive, ele usava um estagiário da unidade onde trabalhava, para comprar bebida, que ele consumia dentro do veículo, o que explica o fato de terem sido encontradas latas de cerveja dentro do carro”, pontuou o delegado.

Em relação ao estagiário, a secretária de Saúde de Imbituva informou que o caso está sendo estudado para que medidas legais possam ser tomadas, uma vez que, segundo Gessana, ele nunca saiu em horário de trabalho para comprar bebidas para o médico.
Em entrevista à Najuá, o advogado da família da vítima, Maurício Zahdi Stecinski, afirmou que o fato de terem sido encontradas latas de cerveja no carro do suspeito não deve ser considerado um agravante para uma possível pena, se o caso for a júri popular e houver uma condenação.
““Agravante não, mas elas são mais um reforço de um indício de que isto (alcoolismo) era cotidiano na vida dele e corroboram com o estado em que ele se encontrava, apesar de elas talvez não terem sido ingeridas no dia, mas corroboram com o estado em que ele entrou no hospital, perante os policiais, com fala enrolada e andar cambaleante, demonstrando que realmente a bebida é um hábito cotidiano na vida dele. O fato é que, a partir do momento em que você ingere bebida alcoólica, entra em um veículo e transita em alta velocidade em um local onde tem sinalização e barreiras de obras na pista, infelizmente você está assumindo o risco de fazer mal para alguém com toda certeza. Se não fosse o Patrick, seria um trabalhador que está na beira do asfalto, um pedestre, ciclista ou outro motorista no lugar dele”, comentou.

Segundo o delegado, outra testemunha afirmou em depoimento à Polícia que havia pedido que o médico não dirigisse naquele dia. “Esta testemunha afirmou que o médico estava visivelmente alterado, xingando bastante e não tinha condições de pegar a estrada. Mesmo assim, ele ignorou o pedido da testemunha e pega a estrada, assumindo totalmente o risco de produzir resultado de morte”, comentou Thiago.
No momento da batida, o carro da vítima estava com o freio de mão puxado. Mesmo assim, com o impacto, o veículo de Patrick foi lançado a uma distância de três metros do local onde estava e colidiu contra um caminhão que estava parado. “Estamos falando de um acidente terrível, em que um profissional da medicina tirou a vida de alguém quando deveria salvar. Os veículos estavam na mesma mão de direção, não foi um choque de frente, por imprudência ou negligência: estamos falando aqui de um caso em que uma pessoa não tinha condição nenhuma de dirigir e mesmo assim assume o risco em produzir como resultado a morte de alguém”, pontuou.
A investigação apontou que o veículo conduzido pelo médico estava em alta velocidade e não parou, uma vez que não havia marcas de frenagens no local do acidente. O delegado afirmou que não foi possível aferir a velocidade do Volvo no momento da colisão. Porém, para a Polícia Civil, o motorista estava trafegando em velocidade muito acima da permitida por lei.

“O trecho estava passando por obras, e era de conhecimento de todos que estas obras acontecem há muito tempo, e ele sabia disso, pois fazia sempre este mesmo trajeto. O trecho estava bem sinalizado, temos uma testemunha que fala que ele passou em altíssima velocidade por ela e que o trecho estava sinalizado, mas sequer há marcas de frenagem na pista. O laudo comprova que este cidadão não freou: ele colide contra o veículo da vítima com a velocidade que estava vindo da pista, provavelmente bem acima do limite compatível, que era de 80km/h”, frisou.
Após as investigações, a Polícia Civil decidiu indiciar o motorista por homicídio com dolo eventual, segundo Stecinski. ““Pelo impacto, pela colisão, percebe-se que a velocidade era excessiva. Ademais, era um trecho que estava em obras, então (os motoristas) deveriam ter mais cuidado ainda, e ele, na profissão que escolheu para viver, deveria ter mais respeito pela vida humana e mais cuidados”, comentou.
O caso será repassado ao Ministério Público, que deverá decidir se oferecerá denúncia. O delegado contou que, se a denúncia for confirmada, o caso poderá ser levado ao júri popular. Em caso de condenação por homicídio com dolo eventual, a pena do médico pode chegar a 20 anos de prisão. Stecinski diz que a defesa espera que a denúncia seja aceita pelo MP nos mesmos moldes do relatório da PC.
“A decisão foi acertada, com o nosso auxílio foram levantados diversos elementos que culminaram para que o delegado tivesse a assertividade de proferir esta decisão, e esperamos que ela seja reconhecida pelo MP e que o órgão ofereça denúncia nos mesmos moldes”, frisou.

Versão da defesa – Em vídeo, o advogado de defesa do médico, Gustavo Britta Scandelari, disse que tomou conhecimento por meio da imprensa de que as investigações seriam encerradas ontem. Porém, em consulta ao processo eletrônico, ele verificou que vários documentos foram juntados recentemente e afirmou que não houve tempo hábil para que eles fossem estudados pela defesa. O advogado afirma que algumas situações precisam ser esclarecidas.
“Há ainda muitos pontos a serem apurados, a serem investigados pelas autoridades responsáveis, mas temos certeza de que o que houve aqui foi um acidente de trânsito, sem intenção (de matar), algo culposo. Houve talvez ali, no máximo, uma imprudência, e foi por esta razão que, desde o início, recomendamos que fosse feito contato com a família da vítima. Nós já fizemos um contato com os familiares de Patrick, e a nossa intenção é de realizar uma compensação por danos morais e materiais, para que este assunto seja resolvido da melhor maneira possível para a família da vítima”, frisou.
Em paralelo, a defesa continua acompanhando o trabalho das autoridades. Para Gustavo, a sinalização da BR-153 no ponto onde ocorreu o acidente era questionável. “Temos também como ponto muito importante de investigação o fato de que a sinalização da estrada no ponto em que houve o acidente era muito questionável porque estava em obras ali naquele momento, logo depois da curva onde ocorreu a colisão. Este ponto tem que ser apurado porque temos um vídeo de outro condutor, que já está em nosso poder, que passou naquele local momentos depois e disse que ele mesmo quase colidiu porque a sinalização não estava adequada”, comentou.
