Durante o evento “Lugar da mulher é onde ela quiser! Desafios e pluralidades” realizada no dia 22 de março em Irati, a secretária estadual da Mulher e Igualdade Racial, Leandre Dal Ponte falou sobre a participação da mulher na política/Texto de Karin Franco, com reportagem de Paulo Sava
A secretária estadual da Mulher e Igualdade Racial, Leandre Dal Ponte (PV), esteve em Irati no dia 22 de março participando do evento “Lugar da mulher é onde ela quiser! Desafios e pluralidades”, realizado no CT Willy Laars, onde falou sobre o local da mulher na política.
Leandre foi a primeira mulher paranaense eleita para cumprir o terceiro mandato consecutivo na Câmara de Deputados. Licenciada do cargo para assumir a secretaria estadual, ela destaca que a conquista é importante, mas entre os homens a reeleição para deputados é algo normal. “No campo político, para as mulheres, temos essa tristeza porque nós sabemos que, se fosse fazer uma comparação, nós temos deputados que tem dez mandatos. E temos que comemorar o terceiro mandato. Lógico, que para mim, é uma alegria. Mas eu acredito que nós temos que ter muito mais mulheres participando das decisões que afetam a vida das pessoas, porque as pessoas acham que política não é lugar de mulher, mas é ali que se decide tudo. Você precisa estar junto nessa discussão, se você quer um mundo melhor, se você quer uma sociedade melhor, se você quer uma vida melhor”, disse.
Quer receber notícias pelo whatsapp?
Das 513 cadeiras na Câmara de Deputados, apenas 91 são ocupadas por mulheres, representando somente 18% do total. O número é pequeno, mas aumentou desde a última eleição. Até o ano passado, eram apenas 77 mulheres no plenário.
Para Leandre, leis diferentes seriam aprovadas no País se o número de representantes mulheres e homens fossem iguais. “As leis que estão sendo votadas e aprovadas hoje são ditadas por aqueles que estão lá. Eu acredito muito que, no momento, que nós tivermos mais mulheres nas Câmaras de Vereadores, na Assembleia Legislativa, na Câmara dos Deputados, no Congresso Nacional, seguramente as leis que nós vamos aprovar, as prioridades do nosso País, vão ser diferentes”, explica a secretária.
Em Irati, a participação das mulheres também cresceu na última eleição municipal. A Câmara de Vereadores de Irati ficou quase 20 anos sem uma representante do sexo feminino. Em 2021, as vereadoras Teresinha Miranda Veres (PSC) e Vera Maria Gabardo (PV) assumiram posições no plenário. Já em março, Genilse Aparecida Holtman Menon (PV) assumiu a vaga do vereador Helio de Mello (PV), que está de licença até o dia 15 de abril.
A participação das mulheres também aumentou no Executivo municipal, com Ieda Waydzik (PV) assumindo o cargo de vice-prefeita de Irati. Ela também participou do evento em Irati e destacou a necessidade da participação da mulher na política local. “Quando você tem um pouco de poder político, você pode escolher aquilo que você vai fazer e se aquilo vai beneficiar mais as mulheres ou mais os homens, as crianças, os idosos. A prioridade dentro da política, muitas vezes, é diferente para mulher do que é para o homem. Isso faz toda a diferença quando nós temos mulheres seja no parlamento, seja na área do Executivo, na gestão”, afirma.
Nova secretaria: Ainda em Irati, Leandre também comentou sobre o desafio de assumir a nova Secretaria Estadual da Mulher e Igualdade Racial. Ela se licenciou do cargo de deputada federal e disse querer contribuir com a região na nova posição. “Continuamos tendo a prerrogativa do mandato, mas como, nesse momento, o governador precisa começar a construir políticas de Estado para essas áreas, que são tão importantes, eu não podia me furtar dessa responsabilidade de ajudar nessa construção. Até porque sabemos que mais de 50% da população paranaense são mulheres. Nós sabemos que o nosso estado ainda precisa construir muitas políticas públicas para chegar na igualdade seja ela de gênero, de raça. E, também, nós sabemos que a nossa população está envelhecendo e que são grandes desafios. Eu entendo que sendo deputada e ajudando aqui no estado, vou poder ajudar ainda mais Irati e região, da Amcespar e de todo o estado do Paraná”, disse.
A secretária destaca que a pasta é transversal, com assuntos e programas que também são tratados em outras pastas, como as Secretarias de Educação e Saúde. Segundo Leandre, o objetivo é verificar os programas que são trabalhados nas pastas e encontrar maneiras de aprimorá-los, dentro da nova secretaria. “O nosso trabalho tem sido o mapeamento desses programas que já estão sendo executados pelo Governo do Estado e com bons resultados. Mas para que possamos aprimorá-los, fazer com que ele chegue para o maior número de pessoas possíveis aqui no estado do Paraná, com uma interlocução – além de intersetorial entre todas as secretarias do Estado – fazer essa interlocução com os outros poderes, com as outras instituições que são atuantes nessas pautas. Mas, principalmente, uma interlocução interfederativa que é com os municípios porque é onde as mulheres, os idosos, as pessoas precisam de políticas onde elas moram que são nas cidades”, explica Leandre.
Dentro do planejamento, há a intenção de criar um programa que auxilie no custo de manutenção de alguns programas municipais. “Eu, enquanto secretária, quero poder ajudar os municípios a financiar esses equipamentos, que hoje é feito quase que exclusivamente pelos municípios, com o orçamento só das prefeituras. Queremos construir esse formato de financiamento compartilhado com o governo do Estado e com o governo federal”, conta.
A secretária destaca que é preciso de políticas públicas que auxiliem a autonomia da mulher. “Nós não queremos mais que a mulher seja vítima da sociedade. Sabemos que as mulheres têm muita capacidade e elas são preparadas. O problema é que a sociedade muitas vezes não está preparada para aquilo que as mulheres precisam porque, para que a mulher possa desenvolver todo seu protagonismo, ela precisa para além de políticas apenas para ela, precisa de políticas que apoie para que ela também possa viver a sua vida, ser autônoma”, disse.
Leandre salienta que algumas políticas públicas voltadas para outras pessoas podem ajudar as mulheres. “São as mulheres, na maioria absoluta das vezes, que desistem da vida profissional, que largam o emprego, que desistem dos estudos, largam a escola, para cuidar de um filho, para cuidar de uma pessoa com deficiência, para cuidar de uma pessoa idosa. Quando trazemos a possibilidade do município de Irati ter o complexo social Cidade do Idoso, eu estou fazendo uma política para as pessoas idosas, mas eu também estou fazendo uma política para as mulheres. Esse equipamento vai dar oportunidade para os idosos serem muito bem atendidos aqui em Irati, mas para que as mulheres também não tenham que ter mais essa sobrecarga. Na hora que tiver um pai que já estiver mais idoso, na hora que a mãe tiver mais idosa e até mesmo para todos aqueles que são jovens. No futuro, eles poderão ter uma vida de autonomia, sem que para que eles tenham essa autonomia, outra pessoa precisa de desistir de todos os seus sonhos”, explica.
Feminicídio: A secretária também comentou sobre a violência doméstica, relembrando o caso de Ivanilda Kanarski que foi assassinada pelo marido na frente dos filhos no Parque Aquático de Irati, no dia 26 de julho de 2018. No júri popular, foi afastada a qualificadora de feminicídio (crime cometido pela condição da vítima ser mulher). Porém, o réu foi condenado a 24 anos e 4 meses de prisão.
Para Leandre, a lei do feminicídio ainda não é bem conhecida e está em um processo de aprimoramento, mas ela destacou que há outras situações que influenciam nestes casos. “Temos que lembrar que é uma questão cultural também, histórica das mulheres, porque a violência contra mulher não começa na violência física, nem no feminicídio. Ela começa muito antes disso, quando uma pessoa, um homem, quer exercer um poder superior a mulher, fazendo com que ela seja subordinada a ele. Esse cuidado que sempre temos que ter quando avaliar um caso de violência e sabemos que, historicamente, as mulheres vêm de um passado, não muito distante, de subordinação, de inferioridade, que persiste até hoje, infelizmente”, disse.
Em contato com a nossa reportagem, o advogado de defesa da família de Ivanilda, Vandir Francaro, disse que os jurados que participaram do júri popular entenderam que o caso foi um homicídio, pois teria ocorrido em função de um conflito familiar. “Então o entendimento não foi do juiz, o entendimento foi dos jurados que a morte de Ivanilda foi um por um conflito familiar e não necessariamente por ela ser mulher”, afirmou Vandir. O advogado explica que o crime de feminicídio possui uma pena inicial de 14 anos de prisão. Já o homicídio prevê uma pena de 12 a 30 anos de prisão em caso de condenação.
“Nesse caso João Fernando [Nedopetalski] foi condenado com uma pena de 24 anos e quatro meses. Uma pena bastante alta pelo que a gente tem visto ultimamente. É claro que não vai trazer a vítima de volta, não, mas a pena é bastante elevada para o caso do homicídio como como ele foi condenado. Pelo crime de feminicídio a pena poderia ser um pouco maior, dependeria de como que os jurados iriam ver as circunstâncias como o crime aconteceu”, relata o advogado.
Vandir ainda analisa que a legislação sobre feminicídio é nova e gera dúvidas de julgamento por parte de juízes e desembargadores. “Agora vejamos que se para advogados e juízes é difícil haver esse entendimento e que todos pensem da mesma forma com relação ao crime de feminicídio, imagine para as pessoas que não tem formação na área jurídica. Porque não é simplesmente que você tirou a vida de uma mulher, é um feminicídio. Precisa ver as circunstâncias”, afirma.
O advogado relata que João Fernando responde um outro processo que tramita em segredo de justiça, que pode elevar sua pena para 30 anos ou mais de prisão. Vandir diz que a defesa ajuizou uma ação solicitando dano moral aos filhos de Ivanilda. “Esse processo foi julgado favorável para os filhos da Ivanilda e hoje eles têm um crédito para cobrar do João Fernando de R$ 860 mil. Então, como esse processo terminou, a partir de agora ele passa para uma fase de cobrança, de execução contra o João Fernando e como há um inventário em andamento, então vai se aguardar encerramento do inventário e os bens que forem pertencer pra João Fernando, eles vão acabar sendo assegurados para pagar essa dívida para os filhos”.
No Paraná, a data de 22 de julho foi instituída como Dia Estadual de Combate ao Feminicídio em memória à advogada Tatiane Spitzner, que foi encontrada morta após uma queda da sacada do apartamento onde morava com o marido Luis Felipe Manvailer no centro de Guarapuava. Um laudo atestou asfixia mecânica como causa da morte de Tatiane. Momentos antes da morte, câmeras do prédio em que o casal morava registraram cenas em que Tatiane era perseguida e agredida violentamente pelo marido no estacionamento e no elevador. Manvailer foi condenado a 31 anos e 9 meses pela morte da esposa.
Recentemente, a Câmara Federal aprovou uma proposta que institui pensão especial aos filhos das vítimas de feminicídio. O projeto segue para discussão no Senado.
Leandre destaca que apesar do ditado de que “em briga de casal, não se mete a colher”, é preciso que as pessoas se conscientizem sobre a violência doméstica. “O problema é que ainda tem algumas pessoas que não entendem as mudanças que aconteceram. O quanto que é importante as mulheres terem a sua autonomia, elas têm os seus direitos garantidos e o quanto é importante você poder garantir esses direitos. Infelizmente, as pessoas quando ouvem essas frases, sabem que existem pessoas que são vítimas de violência e acabam reforçando a violência contra essa pessoa. Todo o desenrolar dessa violência, a pessoa pode não sentir emocionalmente o custo disso, mas economicamente, todos nós pagamos a conta. Tudo aquilo que nós vamos ter que fazer agora, enquanto política pública, para proteger as mulheres da violência, cometida pelos homens contra as mulheres, quem que paga? É o Estado que paga. É quem contribui com seus impostos”, explica.
A secretária ainda pontua que a sociedade precisa estar atenta aos casos de violência doméstica. “Quando eu digo que a própria sociedade não está preparada para isso, é quando a sociedade acaba chancelando essa violência porque, muitas vezes, a mulher não denuncia. Claro que tem questões estruturais e institucionais por falta de equipamentos públicos e políticas públicas, mas existe uma questão cultural também, que a própria sociedade discrimina uma mulher que é vítima de violência. É a própria sociedade faz pouco caso e só nos damos conta disso quando acontece uma tragédia como aconteceu em Irati”, afirma.