Proposta é de que piso salarial da enfermagem seja de R$ 4.750. Atualmente, há salários iniciais de R$ 2.500 para enfermeiros e R$ 1.600 para técnicos de enfermagem. Proposta deve ser votada por deputados federais na próxima semana/Karin Franco, com reportagem de Paulo Sava e Rodrigo Zub
Aguinaldo Hurbik e Cristiana Maria Schvaidak fazem parte do grupo de profissionais da enfermagem que defendem a aprovação do projeto que estabelece o Piso Nacional da categoria. Foto: Rodrigo Zub |
De acordo com o técnico de enfermagem da Prefeitura de Rebouças, Aguinaldo Antônio Hurbik, o projeto é importante para valorizar a categoria. “Em relação à nossa região, nós temos o conhecimento de que, em média, um técnico ganha R$ 1.800, R$ 1.600 de piso salarial. Em alguns municípios, é muito mais baixo essa questão”, disse.
Já para os enfermeiros, o valor mínimo do salário inicial é diferente em cada município. Há locais onde o salário inicial é próximo do valor proposto do piso, mas há outros locais que pagam apenas metade. “Mas também existe e é conhecimento nosso, de pisos de enfermeiro que chegam em média R$ 2.500 e 2.800, em relação à piso”, explica Aguinaldo.
Até a próxima semana, profissionais da área se mobilizam por meio das redes sociais para destacar a importância do projeto. Além das redes sociais, os profissionais tem levado o assunto à imprensa e entrado em contato com deputados do Paraná para que eles aprovem o projeto.
A estimativa é que na região existam mais de 10 mil profissionais da área de enfermagem, incluindo enfermeiros, técnicos, auxiliares e parteiras. A enfermeira e secretária de Saúde de Rio Azul, Cristiana Maria Schvaidak, destaca que esses profissionais devem ser valorizados. “A enfermagem precisa ser reconhecida. A pandemia nos mostrou que a enfermagem foi fundamental em todo esse processo. Enquanto as pessoas faziam home office, nós não fazíamos. Nós estávamos lá na linha de frente”, disse.
Para Cristiana, é preciso estabelecer um piso nacional para diminuir as diferenças salariais. “Não temos ainda um piso salarial. Não temos um piso nacional. Nós temos pisos regionais. Até dá para ver a diferença: Irati tem um piso, Rebouças tem outro, Rio Azul tem outro. Cada município paga um piso diferente para enfermagem. Nós precisamos nos organizar para que aconteça um piso nacional”, conta.
A secretária reconhece que o aumento do piso salarial pode impactar especialmente nas contas públicas, mas destaca que uma comissão já realizou um estudo para viabilizar o piso. “Existe o impacto financeiro. Não podemos dizer que não existe. Existe um impacto financeiro. Mas também nós vemos uma luz no fim do túnel que os nossos deputados não estão só preocupados em votar esse piso salarial. Eles também estão com uma frente de estudo para ver de onde que vai sair esse recurso para pagar esses profissionais”, disse.
Cristiana conta que deputados tem procurado encontrar maneiras para disponibilizar os recursos. “Os próprios deputados já estão alinhando para algumas formas. Quem sabe seja o momento de ajustar a Tabela SUS que faz mais de 15 anos que não é reajustada para os hospitais filantrópicos, por exemplo, ou buscar outras formas de emenda para custear essas despesas. Mas claro que não é só votar o sim ou não, existe essa preocupação, com certeza”, explica.
A deputada federal Carmen Zanotto (Cidadania-SC) coordenou um grupo de trabalho sobre o impacto financeiro do piso, que chegou a algumas sugestões sobre a origem dos recursos para o aumento. Aguinaldo explica que a diminuição de impostos trabalhistas está entre as propostas. “Os serviços privados podem se enquadrar em uma nova categoria de faturamento, que pode diminuir a questão de incidências trabalhistas em relação a isso. A relação da questão da contribuição do Sistema S e também tem a possibilidade de que seja usado como recurso uma lei que fala sobre a adequação dos jogos de azar no Brasil. Dali sairia, eles estão estudando entre sair de 4% a 12% desse valor para ser usado no piso, além da contribuição da exploração mineral, 3,5% desse valor. Juntando tudo que vai para usar para ser a fonte de recursos”, afirma Aguinaldo.
Para hospitais filantrópicos, como é o caso da Santa Casa de Irati, a proposta é que tenha aumento do Fundo Nacional de Saúde (FNS) para atender os que estão dentro do Sistema Único de Saúde.
A secretária explica que no município de Rio Azul, o aumento teria um impacto médio nas contas do município. Ela conta que espera que as sugestões de recursos sejam aceitas para o projeto ser aprovado. “Teria impacto sim. Tem a questão da lei da Responsabilidade Fiscal. Com certeza, é super importante a votação e a aprovação, mas também estamos na espera de que, por exemplo, a deputada Carmem, que tem todo esse estudo, que isso se efetive também. Porque eu tenho certeza que também se nós não tivermos o recurso, o presidente não vai funcionar a lei”, disse.
Para Aguinaldo, a aprovação do projeto é um modo de corrigir um achatamento de salários que ocorre na área. “Hoje eu com 21 anos de carreira, eu não recebo nem esse 50% desse valor [do piso]. Falta uns R$ 800 a R$ 700 para chegar a esse valor. Essa lei vem corrigir todo esse achatamento que teve desse salário de todos trabalhadores da área da saúde, questão de enfermagem”, explica.
Os profissionais justificam que o aumento auxiliará na correção do cálculo de benefícios, como o auxílio doença. Em alguns casos, o profissional pode receber um valor a mais que o salário como insalubridade e incentivos, mas esses valores extras não entram na base de cálculo. É o caso de Aguinaldo, que recebe R$ 1.700 como salário. “Eu tenho mais auxílio não sei o quê. Incentivo não sei o quê. Ele vai engrossando o pagamento e claro, às vezes, ele dobra, você chega a dobrar isso que a gente ganha. Só que o seguinte: se eu ficar doente, eu vou receber pelos R$ 1.700. Se eu tiver que me ausentar, eu vou receber pelos R$ 1.700”, disse.
Cristiana ainda ressalta que os baixos salários iniciais fazem com que os profissionais tenham que encontrar outras formas de atuação, o que pode impactar no serviço prestado à população. “Tem técnicos de enfermagem ganhando R$ 1.400 por mês. Não desmerecendo nenhuma outra profissão, mas o profissional de enfermagem cuida de vidas, cuida de seres humanos. Às vezes, precisa ter uma jornada dupla, uma jornada tripla, precisa ter dois três empregos para conseguir ter para cuidar da sua família. E aí trabalha com sobrecarga de trabalho, cansado. Vemos a mídia expor alguns erros cometidos pelos profissionais de enfermagem e se você aplicar uma injeção errada, não tem como tirar do ser humano. Se você trabalha no escritório e digita algo errado, você nem imprime, você deleta. Só que não tem como deletar uma injeção errada. Os nossos profissionais são assim, a maioria deles trabalham com uma dupla jornada, justamente por essa remuneração muito pequena”, conta.
Para os profissionais, o estabelecimento de um piso salarial pode ser um a oportunidade para que mais discussões sobre soluções de financiamento do SUS possa acontecer. “Tudo isso é um começo para que possamos discutir mais a fundo até o financiamento do SUS mesmo para essas instituições. Haja visto que não passará o projeto se não tiver fonte de recurso, indicativo e presente para mandar para essas instituições e reformular. Mas eu creio que nós começamos, através da mão de obra, do serviço propriamente dito da enfermagem, que é um serviço nobre, que nós fazemos parte, a fazer essa discussão e engrossar a voz junto com essas gestões, até mesmo chegando no Governo Federal, para que venha o financiamento, que melhore esta Tabela SUS, que melhore tudo. Nós estamos falando é de um efeito cascata que pode haver. Imaginamos dessa forma”, disse Aguinaldo.